23/11/2008

A galeria foi percorrida em silêncio. Cada tela apreciada sem ser pronunciada uma palavra. O casal lésbico sempre ali ao lado foi talvez a presença mais calorosa ao longo daquela visita frívola. Até que chego a uma sala onde uma tela projecta sempre o mesmo vídeo, de alguém que traça círculos infinitos à sua volta. E do lado de lá da tela, uma criança. Da qual só vejo a sombra. Os canudos caíndo do alto da sua pequena cabeça num rabo de cavalo comprido. E a sua sombra leve, embalada no infinito dos círculos do vídeo, ingénua. Deixo-me ficar, sinto tudo cair por terra. Sinto-me uma versão forjada do Peter Pan. Vejo-me naquela sombra projectada na tela. Vejo-me de cabelo apanhado em rabo de cavalo, vejo-me dançar na rua onde ficava a minha casa, e sinto-me feliz porque ainda nada sei do mundo. E nada pode ou consegue superar essa felicidade da infância. Invejo-a, mais do que tudo, invejo a sua inocência, invejo a protecção que sente na mão da mãe que a pega e a leva galeria fora. Nesse momento, inveja. E um olhar a ficar marejado, para logo se conter e rumar porta fora. Sim, porque os corações de pedra não choram.

Lá fora está frio, e o silêncio mantém-se inquebrável. Já dentro do carro, dois ou três bafos de erva, já não sei, trazem-me de volta a realidade ainda mais crua. Falar de sentimentos? Naaah. Os corações de pedra não o fazem.

Quero voltar lá para dentro, esconder-me atrás da tela e assim criança dançar para sempre.

clair de lune-cello - Debussy

13/11/2008

Da ruralidade


Sentava-se quase todos os dias na mesma carruagem que eu. E nunca deve ter reparado em mim como eu fazia com ela. Imagino que viesse de algum sítio de nome estranho desses que abundam para lá do Tejo. Fazia-me lembrar as mulheres da minha aldeia. Ar de alcoviteira alheada do mundo, sempre atenta aos movimentos das vizinhas, e adivinho que aos casamentos e aos funerais do bairro também. E não houve um único dia que a visse percorrer aquele caminho sem a sua companhia inabalável: a Maria a espreitar de dentro da mala. Sim, a Maria, aquela revistinha para donas de casa onde se fica a saber os problemas sexuais que assolam o país. E todos os dias ela folheava a revista, de trás para a frente – quiçá por não haver disponibilidade orçamental para outras publicações. E todos os dias eu ficava espantada a contemplá-la, num misto de adoração que nunca consegui muito bem deslindar. A familiaridade com as mulheres que deixara para trás na minha aldeia? A simplicidade tosca que ainda hoje me repugna e atrai? Ou a terrível possibilidade de eu própria me ter tornado numa dessas mulheres rústicas, intrépida alcoviteira, costureira do maldizer alheio? Bata dos chineses em riste (diz que ali para Pegões há umas muita baratas), as chinelas a fingirem-se de ortopédicas, a orelha sempre atenta, a língua sempre afiada. Seria eu feliz assim? Casada com o pedreiro ou com o padeiro lá da aldeia? E se eu me tivesse entregue à ruralidade?


#: http://tue-tue.typepad.com/

20/10/2008


Nunca pensei que me fosse habituar a ver a tua foto numa pedra de cemitério. Aliás, nunca tinha sequer tido esse pensamento. À excepção de quando acordava a meio da noite em criança, a almofada molhada, os olhos inundados de terror. E ia sorrateira ao teu quarto espreitar-te, confirmar a tua respiração, convencer-me de que ainda ali estavas para mim. Convencer-me de que lá estarias sempre.

Hoje misturo-me com a procissão negra das viúvas no meio das campas cinzentas e desgastadas. Sem flores, sem ilusões, sem sonhos. Só as lágrimas que levo comigo e que te deixo quando vejo a tua foto. Será que me vês? Será que me sabes visitar-te? Será que queres flores? Quando tudo o que queria era o teu abraço...

Nunca me hei-de habituar à tua fotografia dramaticamente tranquila naquela pedra que nada diz sobre ti, sobre o que fomos juntas. Sobre o quão felizes ainda podíamos ter sido.

08/10/2008


E uma intimidade impossível de delinear. No meio da multidão, sinto-te sussurrar a escassos centímetros a tua boca da minha nuca. Insistentemente a procurar os limites, as linhas com que se cose a fatiota janota em que nos metemos. Não consegues, nunca vais conseguir. É como comprar um one way ticket. Entras em mim e não há mais saída possível, labirinto sem saída não por defeito mas por feitio.

A aliteração pobre de uma criança de 12 anos. Amo-teadoro-teamo-teadoro-te. Poupa-me! Dejà vu não faz o meu género! Bato a porta e saio. Enquanto desço as escadas furiosas, consigo ainda ouvir a copo de vidro que cai no chão enquanto faço o piso tremer. Sinto cada caco a partir, a estalar dentro de mim. E a fúria de não saber onde nem começas nem onde acabas. Pois aí estarão também o meu princípio e o meu fim.
E seres como o cheiro da terra quando chove. O melhor cheiro de todos os cheiros do mundo desde que me vejo ser eu, desde que a ameaça da vida passa por mim. Seres o melhor dos cheiros. O cheiro do campo quando chove. Esse odor mais límpido, suave, sonante e silencioso do mundo. O mais mais mais que tudo de todos os cheiros do mundo. E tu seres terra molhada, fértil, húmida. Seres a tranquilidade em mim, o silêncio e os pássaros.



Sento-me e bafo só um pouco mais. Deixa-te dessas merdas, insisto inutilmente. Pensamentos cada vez mais estúpidos os teus, sua inergumena! Pássaros e terra molhada??? Tsss tsss, já vi melhores dias!

16/09/2008


vais-me desaparecer?



Hoje novamente. Pegar no telefone para lhe ligar. Cair na realidade no mesmo instante. Não há nenhum número gravado. Não há ninguém do outro lado da linha. Há já muito tempo. Tempo demasiado para uma dor tão grande num peito tão pequeno. O telefone estupidamente parado a meu lado, porque ninguém chegará à voz dela quando me atendia. Porque não vale a pena ligar a ninguém. Ninguém me amará tanto do outro lado do telefone.
As pessoas do metro são demasiado feias. E a música que sai dos meus auscultadores torna-as ainda mais feias, sujas, mal dispostas, azedas, cinzentas. E não as consigo encarar. Nem elas a mim. Fugimo-nos reciprocamente, inevitavelmente, circularmente. Olhares ping-pong. O meu bate em ti, tu passa-lo para o da frente, o da frente para o do lado. pingpongpingpongpingpong. DINGDONG Marquês de Pombal, há correspondência com a linha amarela (uffffffffffffffffffff) e respiro finalmente. Enquanto subo a Braamcamp, evito pensar porque odeio tanto as pessoas do metro. Mas a verdade é translúcida demais para lhe fugir. Com as evidências não há pingpong. Não são as pessoas do metro que são feias. É o meu cinzento que as torna feias, é o saber-me igual a elas. Eu também sou uma das pessoas do metro. Umas das feias, sujas, mal dispostas, azedas, cinzentas pessoas do metro. Olho-as e odeio-as por me saber ser assim também. São já 8h27. Oito horas e vinte e sete minutos. Pico o ponto e urante todo o dia fingirei um não-encontro com as pessoas do metro. E finalmente às 17h voltarei a odiá-las/odiar-me. Às dezassete horas.


sabia-me bem o colo dela

02/09/2008


Lisboa devia ser sempre Agosto. Setembro e sentem-se as hordas impiedosas de gente chegar sequiosa, voraz, cansada. Setembro morno abraça Lisboa languidamente, num abraço que só perderá força no próximo Agosto. E no outro. E depois no outro. Até lá, a cidade será da multidão.

Sorve-se ainda o que sobra de Agosto. As estradas ainda reservam uma réstia do espaço que predominou. Há quem ainda consiga fingir o bucolismo que então devastou Lisboa. Eu já não consigo fingir. Os olhos dos outros pregados no chão são inevitavelmente contagiosos, a melancolia por um estado de alma que já está a um ano de distância. A ansiedade frustrada/frustrante de querer sobressair no meio da multidão e de nunca sair do mesmo sítio. Agosto deixou a ilusão doce de que a cidade era dos sobreviventes que cá ficaram. E durante 31 mágicos dias, fingimos insensatamente que Setembro não chegaria. Mas chegou, ímpio e cortante.


(suspiro) E Lisboa, que devia ser sempre Agosto... (suspiro)

27/08/2008

E afinal, há feridas que não estavam tão fechadas como se pensava. Nem perto de saradas. Enchendo o dia-a-dia de farsas, de pequenas encenações, dramas, tragédias. Enchendo os dias de pensos rápidos, daqueles que ajudam a estancar o sangue. Mas há sempre feridas que não fecham, que clamam por mais atenção, por mais pensos rápidos.

Felizmente, ainda há quem nos obrigue a por o dedo na ferida, quer queiramos quer não. E damos por nós numa tarde de domingo, um alpendre decorado de lágrimas. Ali sentada no alpendre, desejei ter deixado os pensos de lado ao longo do caminho. Mas não, era mais fácil assim. A cor ocre do penso, promessa de cura imediata tremendamente irresistível. Por o dedo na ferida não é fácil. Faz doer. Mas segundos depois sente-se o coração bombear um pingo de cura corpo fora. E depois outro sorrateiro. E mais outro. E outro. E é nesse pedaço de segundo que ainda se consegue ousar acreditar que a vida poderá um dia ser tudo aquilo que desejamos.

05/08/2008

Os nocturnos de Chopin tiniam-lhe na cabeça insistentemente. Tortura romântica, sôfrega, sabia-o. Uma hipérbole sentimental à qual não conseguia escapar. O estoicismo gratuito a que se prestava. Olhava os livros à sua volta e chorava. Queria tê-los, lê-los. Lê-la, folheá-la, tocá-la como o piano que o perseguia. E ela desafinada, cordas soltas, endiabrada.


郎朗-蕭邦-Op.9 NO.2夜曲.mp3 -

28/07/2008

Penso que cultivo tensões
como flores
num bosque onde
ninguém vai.

Cada ferida - perfeita -,
fecha-se numa minúscula
imperceptível pétala,
causando dor.

Dor é uma flor como aquela,
como esta,
como aquela,
como esta.










Incrível como as palavras nos derrubam, quando nos descrevem melhor do que nós próprios saberíamos fazer. Pequenez absoluta.





A FLOR, Robert Creeley
Trad.:Régis Bonvicino

Bom dia, Doutora. É o café do costume?

Sim, Miguel, obrigada.


Nunca tive destas mordomias. Mas mesmo não fazendo questão, mesmo não me aquecendo nem arrefecendo, o meu ego ficou estarrecido o resto do dia...



#Poema visual de
Marcelo Sahea

14/07/2008

1871... ou 2008?



O país perdeu a inteligência e a consciência moral.
Os costumes estão dissolvidos, as consciências em debandada, os caracteres corrompidos.
A prática da vida tem por única direcção a conveniência.
Não há princípio que não seja desmentido.
Não há instituição que não seja escarnecida.

Ninguém se respeita.
Não há nenhuma solidariedade entre os cidadãos.
Ninguém crê na honestidade dos homens públicos.
Alguns agiotas felizes exploram.
A classe média abate-se progressivamente na imbecilidade e na inércia.
O povo está na miséria.
Os serviços públicos são abandonados a uma rotina dormente.
O Estado é considerado na sua acção fiscal como um ladrão e tratado como um inimigo.
A certeza deste rebaixamento invadiu todas as consciências.
Diz-se por toda a parte: o país está perdido!

Eça de Queirós, “As Farpas”, 1º vol., 1871

#: ClaudioDeSousa


Um prédio atrás do outro branco amarelo rosa branco amarelo rosa azul e verde aqui e ali. Atropelam-se na tentativa vã de me encher a vista, até perder de alcance. O vento já não sabe ao mesmo, insosso, insípido, interior. Fecho os olhos. E esqueço-me de quem ao meu lado segura o volante. Por momentos, és tu quem viaja comigo. Fecho os olhos e poderia jurar que ralho contigo, mete a quarta, olha que assim o carro consome muito. E tu embrenhada nos teus pensamentos, nas tuas desilusões, nas tuas ambições perdidas. E eu a pensar que não quero ser como tu. Não quero ter sonhos por realizar, quero destacar-me, quero que te vejas projectada em mim, que vejas em mim a extensão daquilo que nunca chegaste a ser. Sim, puno-te pelas escolhas erradas que fizeste. Pelas vezes em que ficaste em quarta, em que hesitaste e nos castigaste pelas tuas escolhas. Eu não quero ficar em quarta, mãe. Não quero.

Fecho os olhos mais um bocadinho e imagino-te mais uns minutos. Os prédios e o vento são sempre os mesmos. Só a mão áspera que toco me traz de volta à realidade e sei que não és tu. Acabou-se o tempo das ilusões.

03/07/2008


Quando o computador avariou com inúmeros trabalhos lá dentro, fiquei a saber o que era fazer um backup. E depressa o fiz, para evitar futuras perdas. Quando a pen andou extraviada durante um mês, não perdi tempo em comprar mais duas, de 2 gigas cada, não fosse o diabo tecê-las. O mesmo com as fotos, quando o CD onde estavam gravadas ficou irrecuperavelmente riscado. Felizmente, mais alguém as tinhas algures. Mas entre numa tecnologia e outra, esqueci-me de fazer o backup ao coração. E entretanto, acho que lhe perdi o conteúdo algures. Talvez deixe um anúncio nos classificados.

01/07/2008

Yuppies de todo o mundo, uni-vos!


E se um dia para o outro, a gravata desse lugar a dois botões desapertados, e o casaco a umas mangas arregaçadas?

E os sapatos quadradões, às simpáticas all-star, bem coloridas?

Se de um dia para o outro, o dress code instituído fosse contestado, de um ao outro lado do planeta, originando um Maio de '68 do vestuário?

Pode parecer exagerado, mas agora que virei yuppie (só por fora, que cá dentro as convicções mantêm-se fiéis!), vejo o quão descabidos são certos valores instituídos em certas profissões. Dizem as entidades patronais que os empregados devem vestir-se à imagem dos clientes, e daquilo que os clientes esperam. Que um homem de t-shirt atrás de um balcão é pouco credível, e uma mulher de decote ou de alças ainda menos. Porra, se estiver um calor de morrer, pouco me importa se o homem está de t-shirt ou a mulher de burka! Desde que me atenda devidamente e dentro do esperado! Agora, obrigarem os colarinhos brancos deste e outros países fora a andarem fardados à medida do que o cliente espera, só porque está instituído, só porque é tradição, só porque se convencionou... Mas alguma vez perguntaram ao cliente como é que ele quer ver vestido quem o atende?? Eu também sou cliente aqui e ali, e a mim nunca ninguém me perguntou nada. Ligam a perguntar sobre tarifários, sobre detergentes, até sobre a put@ da tinta que uso nas paredes, mas ninguém me perguntou como é que eu quero ver os yuppies vestidos! Que não pareça que me preocupo com estas questões só porque agora estou no meio! Já antigamente me incomodava, principalmente ver os colegas do sexo masculino sem poderem sequer despir o casaco. Em função de algo de tão ridículo, que não está sequer escrito em lugar algum (a não ser nas normas internas das empresas).


Era bom que a deixa marxista pegasse, talvez o nosso dia a dia passasse a ser mais desafogado. E mais não digo. Vou-me despir.

17/06/2008


Pledge to go fur-free at PETA.org.

Provavelmente já conhecem o horror deste vídeo. Mas ainda assim, merece a maior divulgação. Vejam, se conseguirem....
Pois é, meus caros... este blog tem andado pobrezinho, não é? Habituo-vos mal, e depois sentem-se abandonados, não é? Mas não foi de bom grado, acreditem. Porque este blog tem andado numa afincada luta contra o desemprego. Contra o meu próprio desemprego. E entre entrevistas e esperas infinitas em centros de emprego, lá consegui! I'm back for good!

Não prometo escrita activa, mas... vou manter-me por cá, que uma mulher do Oeste não se deixa derrubar assim à primeira traulitada!

08/06/2008

Uma indescritível sensação. A primeira vez é inigualável. E remete o ego para dimensões pornográficas.

h4rddrunk3r rocks!

04/06/2008

A Srª dona Maria João Avillez, reconhecida jornalista, decidiu ir jantar ao Bairro Alto um destes dias. E diz a senhora na sábado:

Quando saí, já tarde, dei uma volta pela noite e subitamente esbarrei com Bombaim: caixotes do lixo esventrados debruando os passeios, ruas imundas, as paredes do Bairro Alto cobertas de grafitti desbotados, cães vadios por todo o lado, manchas compactas de gente - baça, feia, mal vestida - apagando beatas no chão. Uma vergonha.


Hum, ok, deixa cá ver se eu percebi bem. Eu e grande parte dos meus amigos, que frequentamos o Bairro às sextas, somos vistos como sendo uma vergonha? Baços, feios e mal vestidos? E o Bairro agora parece Bombaim? Ficava mais bonito cheio de bandeirinhas da Selecção, queres ver? Sim, e ainda nem vim barafustar sobre a querida selecção do nosso Portugal, mas é melhor não, que já nem os vejo bem!! Enfim, sodona leide, quando quiser ver florinhas, os canteiros arranjados, as paredes imaculadas e o diabo a sete, é melhor ir jantar la para Cascais ou Tamariz, diz quem lá vai que é mais bonito!

30/05/2008

Descubra as diferenças

O Menphis ainda não autorizou (roubei-lhe não só os textos, mas também a imagem), mas eu não resisti a citar os dois autores que se seguem, os quais separados por cerca de um século, decalcam na perfeição aquela que foi, é e continuará a ser a nossa triste realidade.

Porque na sociedade portuguesa actual, o medo, a reverência, o respeito temeroso, a passividade perante as instituições e os homens supostos deterem e dispensarem o poder-saber não foram ainda quebrados por novas forças de expressão e liberdade.Numa palavra, o Portugal democrático de hoje é ainda uma sociedade de medo. É o medo que impede a crítica. Vivemos numa sociedade sem espírito crítico – que só nasce quando os interesses da comunidade prevalecem sobre o dos grupos e das pessoas privadas.

Parágrafo de José Gil na mediática obra Portugal Hoje, o Medo de Existir, neste início de século. Já no início do século passado, repito, século passado, escrevia o mestre Fernando Pessoa:

Tão regrada, regular e organizada é a vida social portuguesa que mais parece que somos um exército do que uma nação de gente com existências individuais. Nunca o português tem uma acção sua, quebrando com o meio, virando as costas aos vizinhos. Age sempre em grupo, sente sempre em grupo. Está sempre à espera dos outros para tudo. E quando por milagre de desnacionalização temporária pratica a traição à Pátria de ter um gesto, um pensamento ou um sentimento independente, a sua audácia nunca é completa porque não tira os olhos dos outros, nem a sua atenção das suas criticas.


É preciso dizer mais alguma coisa?

Este filme não é para velhos

E já vos oiço murmurar Lá vem esta com a mania que é cinéfila, como se percebesse alguma coisa disto. Mas não resisto e pronto.

Não é o filme do ano, não é memorável, não é nenhuma obra-prima. É um filme simples e inclusivé, algo previsível. Mas tem um brilho extraordinário, conferido pela excelente dupla de actores principais: Jack Nicholson&Morgan Freeman.

Os primeiros minutos de filme, passei-os sempre de nó na garganta. Passam-se inteiramente no hospital, e a temática é sempre a morte prevista. Find the joy in your life, a frase que dá mote ao filme. De resto, pouco há a acrescentar. Pouco ênfase na banda sonora, cenicamente pobre e, impossível não referir, peca pela previsibilidade. Nem do poster gosto, paupérrimo, até no blog fica mal. De resto, é um filme fresco, ideal para um final de tarde em boa companhia.

Última nota ainda: tendo em conta que é a excelente dupla de actores que salva o filme, imaginem-no protagonizado por Steve Martin&Walter Matthau... Seria a catástrofe do ano!

Éramos felizes e não sabíamos...

... imbuídos de uma plenitude que só a forçada inocência da idade podia permitir. Convencidos de o mundo seria fácil de conquistar. À distância de um mero telefone, de um mail, de um click. Convenci-me de que o regresso a casa seria o começar de uma fase inédita das nossas vidas, desejada anos a fio no meio das noites salgadas de lágrimas. E a inocência que me tolhia a visão da felicidade, era a mesma que cobria a realidade de uma crueza baça contra a qual eu nada podia fazer.

Mas havia sempre algo que faltava. Nunca estava tudo completo. Nunca está. E ninguém nos avisou que a felicidade era apenas aquela plenitude insatisfeita. Aquela sede do algo incompleto, do que faltava. Só o avançar dos dias, meses, anos, trouxe o discernimento sobre aquela felicidade que partilhámos. Nós os 3, finalmente só os 3, depois de uma longa espera de 13 anos. Hoje olho para trás e vejo que a felicidade era afinal tão simples, tão tangível. E sim, estava a uma distância muito pequena. Um telefonema chegava. Um prato quente de comida na mesa. A roupa impecavelmente engomada em cima da cama. O cheiro a café e torradas inesperadas pela manhã.

E depois, a morte. Para quem espera 13 anos pela felicidade, a morte é a antítese por excelência do ouro no fim do arco-íris. Arco-íris esse cujos tons acinzentadas faziam prever alguma cor, alguma recompensa por tão longa espera. Mas não. No fim do arco-íris estava a morte, o revés caprichoso da vida, o desfecho mais improvável.

Se hoje sou feliz? Não sei. Talvez sim. Talvez não. Muito provavelmente só o saberei daqui a um ou dois anos. E nessa altura, falamos.

29/05/2008

A mulher forreta e altruísta que há em mim

É inevitável... está toda a gente à beira da loucura com a subida dos preços do combustível. Não se fala noutra coisa. E para não dizerem que eu sou mazinha e que este blog nada de útil tem para oferecer à sociedade, aqui fica a minha oferta. Um site onde encontram os postos de abastecimento onde se devem tornar habitués e os postos a evitar. Vão ficar super hype, e ainda poupam uns cêntimos, trust me!

Preciso de um. Ou de cinco!!!

28/05/2008

Primeiro estranha-se, depois entranha-se

A Taschen tem disponíveis no seu site dois livros muito interessantes. A meu ver, bem sintomáticos da cultura de massas em que hoje vivemos, produtos claros da pulsante aldeia global. Ora vejam:


The Big Book of Breasts, descrito como The supreme worship of the natural bosom. A completar o ramalhete, temos ainda:



The Big Penis Book, ou ainda The fascinating phallus: undressed to impress.


Muito provavelmente, estou apenas profundamente entediada para estar a postar sobre estes assuntos. Mas deixo um cheirinho do que por lá se pode encontrar. Check it out, girls...

Também fiquei no mínimo surpreendida nos primeiros segundos. Mas vá, já chega de queixo caído...!!!
O que o acordou foi o silêncio. Primeiro, o do despertador que não tocou à hora combinada todas as manhãs. Depois, o de outra respiração, que devia ouvir e não ouvia. Estendeu a mão para o quente do outro lado da cama e encontrou o frio. Apalpou e encontrou vazio. Então, sim, despertou completamente.

Miguel Sousa Tavares, Não te deixarei morrer, David Crockett

E pensou no quão diferentes as coisas poderiam ser. Atormentavam-lhe os pensamentos, os vestígios do cheiro dela. AMOR ÓDIO AMOR ÓDIO AMOR ÓDIO. Era assim a promiscua relação que partilhava com o corpo dela. Ora atracção, ora repulsão. O corpo dela fazia-o pensar em arroz doce. No arroz doce que a avó fazia e em cujo tacho ele lambuzava dedos, mãos, cara. Que disparate, arroz doce. Uma mulher comparada a arroz doce. Atina, Miguel!

Pensou como seria se não a expulsasse da sua cama enorme, após cada sessão fotográfica, seguida de jantar, seguida de sexo, seguida de vazio. Conhecia-lhe cada curva de cor, cada poro, cada rugosidade da pele. E no entanto, sentia-se um estranho sempre que ocupava o corpo dela. Não estava de todo preparado para a cumplicidade. Muito menos com o corpo daquela mulher, que amava e odiava.

Pensava nela, tentando esquecer que ela era mais do que um corpo feminino. Tinha ideias fortes, personalidade intensa, objectivos rígidos. E isso atraía-o, ao mesmo tempo que o fazia sentir-se diminuído. Onde é que já se viu, uma mulher destas ocupar o meu espaço. Não, não podia nem devia ser assim. Queria uma mulher submissa, uma mulher que fizesse figura de corpo presente, que não questionasse nem se impusesse. Era machista e - pior - assumia-o sem complexos.

E aquele corpo viera agudizar ainda mais esse sintoma de macho que cultivava em si desde tenra idade. Quanto mais a tinha, mas a queria repudiar, mais a queria agarrar, mais lhe queria bater, mais a queria possuir, mais a queria afastar, mais a queria consumir. Enchia-lhe o estúdio de uma teimosa névoa de tabaco, indiferente aos avisos dele. Com atenção, podia-se encontrar um ou outro cabelo dela espalhado pelo chão. Uma collant esquecida, um resto de baton no lençol. De dia para dia, ia marcando o seu território, na mesma medida em que o território dele se esbatia, pressionado pela força que ela emanava a cada investida nocturna.

Assim se arrastavam, desconhecidos na cumplicidade, cumplices no AMOR ÓDIO que os unia e separava.


#Imagem:
Nuno Bernardo

26/05/2008

Big Brother ou a promoção da acefalia

Estamos a viver num mundo onde ninguém é livre, no qual dificilmente alguém está seguro, sendo quase impossível ser honesto e permanecer vivo.

George Orwell, The Road to Wigan Pier


Já em 1948, George Orwell previa os absurdos que chegariam nesta era Big Brother em que hoje vivemos. Na concepção de Orwell, a Oceania é regida pelo dito Big Brother, ditador totalitário que quer fazer crer aos cidadãos que estes vivem em democracia. Como em qualquer regime totalitário, tudo o que o cidadão pensa ou faz tem que ir de encontro à linha de pensamento do Partido. Caso contrário, se se pensasse diferente, cometia-se crimidéia (crime de ideia) e a Polícia do Pensamento capturava e vaporizava a pessoa em questão. Desaparecia.

Esta redução do pensamento e da opinião infelizmente acontece ainda hoje, nas democracias em que vivemos. Acontece desde as entidades privadas aos organismos públicos. Quem cometa o erro de se pronunciar contra algo que é promovido pela instituição onde se insira, pode muito simplesmente ser alvo de ostracismo, exclusão explícita ou implícita ou, na pior das hipóteses, a expulsão definitiva.

Tanto que podia dizer sobre o assunto.











Mas não se pode,
Big Brother is watching!

24/05/2008


Não foi bem o que imaginava. Mas vale a pena a visita.

23/05/2008

Is there something wrong with me?!

Mas porque raio deciciu a blogosfera EM PESO idolatrar este filme? E dizer que é lindo e faz chorar as pedras da calçada, bla bla bla?!

Achei tão básicozinho, tão indiezinho de trazer por casa, banda sonora tão repetitivazinha, enfim... um filmezinho!

Não sou cinéfila. Pseudo, talvez. Se estou a dizer barbaridades, perdoem-me os entendidos na matéria.

É provavelmente mais um acesso hormonal, nada mais.

Feios Porcos e Maus

Num primeiro passeio por aqui, fui dar com este pequeno apontamento do Miguel Esteves Cardoso, e reza assim:

Os homens são brutos e insensíveis. Matam mais criancinhas, portam-se pior à mesa, cospem e coçam-se mais. Os homems - e sobretudo os homens que gostam de mulheres - são menos inteligente, menos delicados e menos civilizados que as mulheres. A única coisa que têm a favor deles, à parte certas características discutíveis, como serem menos histéricos, é as mulheres gostarem deles. Por que é que a mulheres gostam dos homens? Como lésbica que sou nunca entendi.

Para variar, MEC tem toda a razão. E só mesmo um homem como ele, que não é especialmente atraente (vá, convenhamos, é feio mesmo), tem legitimidade e isenção na afirmação que faz. Gosto quando sublinha o facto de que são sobretudo os hetero que correspondem à descrição. Porque, exceptuando o facto de os homo serem, regra geral, mais histéricos do que nós, em tudo o resto são um amor. Têm melhores maneiras, são mais delicados, têm gosto para moda e para música. Vêm connosco às compras e é uma festa. E podemos sempre comentar com eles aquele rabo fantástico que acabou de passar.

Quanto aos hetero, não quero generalizar e muito menos ferir susceptibilidades aos homens que conheço. E felizmente, conheço poucos que sejam mesmo brutos e insensíveis à séria. Muito menos que matem criancinhas. Alguns, convenhamos, portam-se mal à mesa, cospem e coçam-se. E definitly, outros são mesmo menos delicados (ainda bem!) e menos civilizados que as mulheres.

Não querendo de maneira alguma criar um texto estereotipado (mas já o fazendo), acho que o homem ideal seria mesmo um gajo que reunisse o melhor dos hetero e dos homo. E nem precisava de vir comigo às compras, que lá isso eu faço bem sozinha. Mas podia/devia saber fazer coisas como ir ao Pingo Doce sozinho, comprar-me uns Evaxs sozinho sem entrar em pânico. Mudar as fraldas ao puto sem se esquecer do pó de talco no fim. And so on, uma vez que a lista é quase interminável.

A quem esta reflexão tenha parecido sem nexo algum, cabe informar que estou em fase hormonal, a.k.a TPM.

E tenho dito.

21/05/2008


Eia a conversa de que me lembrei hoje:

Então, que fazes logo?

Ainda não sei, e tu?

Vou beber café com a minha futura namorada.

(risos) Ai sim? E ela sabe?

Ainda não, vou convidá-la agora: h4rdDrunk3r, queres vir comigo beber um café logo à noite?

#?%&?/@€?!?!?!?

Estou com vontade de vê-los hoje no Lux. Diz que é "música gordurosa". Juro!, vi aqui! Ainda por cima, abordam Justice e Soulwax, sonoridades que adooooooooro. Parece que vai haver zing zing ziiingggggg...

20/05/2008

E agora, o Sistema Nacional de Saúde!!!

Desde 5ª feira à noite que estou doente. Daquelas constipações que nos agarram à cama durante 5 ou 6 dias. Como fiquei sem médico de família após a transferência de centro de saúde, tenho duas opções: ou vou para o médico às 8h da manhã para tentar (sim, tentar, porque não é garantido) uma consulta do reforço, ou vou entre as 18h e as 22h. Naturalmente, opto sempre por ir à noite. Porque há muito menos gente, e não tenho que ir às 8h, regressar a casa e fazer tempo e voltar lá para as 11h, quando o senhor doutor se lembrar de me atender.

Até à passada 6ª feira, o médico que me atendia passava-me sempre uma declaração para apresentar no trabalho. Estando doente, é o mais natural. Mas desta vez não. O senhor doutor lembra-se de me dizer que está afixado algures que isso é proibido. Contraponho, dizendo que sempre o fiz, mas não, ele diz que é proibido. Volte cá na 2ª às 8h, que lhe passam isso no reforço...

Temos um lindo SNS, sim senhor. Para além de me fazer pagar a merda das taxas moderadoras duas vezes (sim, que eu não sou isenta, não tenho caixas nem ADSE's nem o diabo a sete), ainda se sobrecarregam a eles próprios, ao obrigarem-me a lá voltar, a pedir consulta de reforço, a encher as já de si cheias filas para o médico, bla bla bla. Pobres das velhinhas cheias de reumático, que vão para lá fazer a conversinha do costume com o médico de família, a levarem comigo, toda ranhosa e insuportavelmente rabujenta, a roubar-lhes a vez! Que horror!

E pronto, não tive outro remédio senão voltar na 2ª feira. Para pedinchar um lugarzinho no reforço. Por acaso continuava doente. Caso contrário, faria a ridícula figura de voltar apenas para pedir o papelinho, e se o médico desse dia decidisse estar mal disposto, às tantas nem mo passava. E lá fui eu, ficar durante meia hora no consultório com a senhora doutora. 5 minutos para me auscultar o peito, outros 25 para ficar a olhar para o monitor, a fazer não sei bem o quê, enquanto eu desfalecia.

A sério, que mal fiz eu...

Meritocracia - s.f. Sistema (p. ex., educacional ou administrativo) em que os mais dotados ou aptos são escolhidos e promovidos conforme seus progressos e consecuções; sistema onde o mérito pessoal determina a hierarquia.


Muito bonita, a língua portuguesa. Muito mesmo, até me emociona. Ainda mais depois da lavagem cerebral a que fui submetida nos últimos 4 anos e em que nos querem fazer crer na meritocracia. Um mito muito bem construído pela democracia. No qual ainda tive a boa fé de tentar acreditar. Eu tentei, juro que tentei. Mas o mito cai por terra, quando vou à Câmara Municipal da Lourinhã, e vejo gerações, pais e filhos, trabalhando lado a lado, numa linda moldura familiar. Ou o filho do médico x e do empresário y. É a sucessão familiar no seu estado mais puro, como se de uma monarquia se tratasse.


O mesmo sucede na reputadíssima faculdade que frequentei. Abre concurso público para a minha área de licenciatura e, surpresa das surpresas, é colocada nessa mesmíssima vaga uma ex-aluna que lá ficou a estagiar logo após a conclusão da licenciatura.


Colégio da Europa: Abrem 4 vagas para alunos bolseiros. Numa instituição prestigiada como é o dito Colégio, seria de se esperar uma ainda maior isenção e, claro está, aplicação da meritocracia, dando crédito às notas dos alunos a concurso. Coincidência das coincidências, um dos candidatos a concurso foi estagiário/colaborador de um dos entrevistadores. A média do candidato a curso andaria à volta dos 15 valores, no máximo 16. E de certeza absoluta que entre os restantes candidatos, muitos deles teriam médias bem superiores. Mas, surpresa das surpresas, é o dito aluno com a média de 15 um dos privilegiados com a vaga num dos colégios mais caros da Europa.


Uma das Embaixadas de Portugal algures no Velho Continente, com mais um estagiário: Gostamos muito de si, mas de momento os recursos orçamentais são escassos. Para o mantermos cá, terá que ficar até Outubro sem remuneração, altura em que seria "seleccionado" num concurso público. E esta, hein? Ele naturalmente não ficou, porque viver numa das capitais mais caras da Europa sem ganhar um tusto não é para qualquer um.


Pergunto-me eu, porque raio ando a gastar dinheiro em selos, envelopes, fotocópias e afins, na vã esperança de conseguir um cargo numa instituição pública, quando é o Factor C que dita as regras no nosso país!?


Não tendo Albuquerque, Amorim ou Vasconcelos no nome, fica difícil convencer algum empregador deste país a olhar sequer para o meu currículo.


Outra situação que acho intolerável são as condições para estágios no PEPAL. Para quem desconheça, decorrem na administração pública e aufere-se qualquer coisa como 2 salários mínimos nacionais. O que é extremamente injusto para pessoas na minha situação. Quem lê o blog sabe perfeitamente que a minha mãe faleceu. Nessa condição, tive que de imediato começar a trabalhar, caso contrário neste preciso momento já teria morrido de fome... Isto em português, dá qualquer coisa como: uma vez que tive que começar a trabalhar (para sobreviver!), não posso disfrutar dos prestigiadíssimos estágios do PEPAL, hipotéticas portas de entrada para o mercado de trabalho na minha área. Desculpem lá, Sr. Presidente da República e Sr. Primeiro-Ministro, se o Estado Social neste país é um mito, se para não morrer de fome, tenho que trabalhar, e se por já trabalhar, não posso fazer os vossos estágios! Sim, porque para se concorrer, é necessária uma declaração do IEFP, da Segurança Social e das Finanças onde se comprove irrevogavelmente que não se está a trabalhar.


Apetece-me tanto pedir-lhes que metam os estágios no cú!

15/05/2008

"You're a part-time lover and a full-time friend"


Ontem, finalmente!

Tantos pontos a favor que nem sei por onde começar. Ensaiemos então uma espécie de triagem.

Banda sonora: intocável. Todas as músicas perfeitamente adequadas aos momentos, versos simplesmente adoráveis, e ainda a soberba frase que redefine todo o conceito de amizade colorida: You're a part-time lover and a full-time friend - caso saibam de quem é a música, deixem-no nos comentários!

Argumento, indescritível. Os comentários de Juno são surreais, de um sarcasmo incomparável, que venero. Humor também não falta. Adoro a cena de ciúmes que Juno faz ao pseudo-namorado-e-pai-da-criança, em que a miúda de quem Juno tem ciúmes é descrita como "cheirando a sopa". Ela e toda a sua casa.

Cenários, o mais kitsh possível, tanta as casinhas da classe média baixa, como as mais abastadas.
De louvar o facto de ser um filme que tem tanto de impossível como de real. Desde a família disfuncional de Juno - não via algo do género desde Uma família à beira de um ataque de nervos - à hot cheerleader que tem uma tara por professores nada atraentes.

Tinha tudo para ser um típico teen movie, mas felizmente resultou em algo bem atípico e mais real do que os filmes de adolescentes americanos.
A única incongruência, a meu ver, é o facto de Juno se interessar por um miúdo que, não obstante o facto de ser muito bom aluno, atlético, etc etc, não tem grande conteúdo. Personagem algo pobre, que pouco jus faz ao ego de Juno.

De resto, recomenda-se!


14/05/2008

O que têm em comum José Saramago, Fernando Meirelles e Gabriel Garcia Bernal?


Vão ser dos nomes mais falados desta noite, na abertura do Festival de Cinema de Cannes. Como se não bastasse o filme ser inspirado num dos meus livros favoritos, é tambem realizado pelo responsável por Cidade de Deus e O Fiel Jardineiro, obras que dispensam qualquer apresentação. E claro, a fechar com chave de ouro, Bernal. Não podia ser mais perfeito.

Espero apenas que não suceda o habitual neste tipo de adaptações, em que a tela fica muito aquém da página. Mas com o elenco e equipa em questão, acho difícil. Só espero que o filme faça referência explícita ao PORTUGUÊS Saramago, e que os espanhóis não venham em bicos de pés dizer que o Saramago isto e aqueloutro, que é mais espanhol que português, e que lhes cabem a eles os créditos do filme... - sim, reconheço que o Iberismo de Saramago é algo de dramaticamente exacerbado, mas isso não dá direito a nuestros hermanos de quereram ficar com ele!

Para saber mais sobre o filme, nada como consultar o blog de Meirelles sobre o mesmo.

P.S. - E não sejam preguiçosos, leiam o Ensaio sobre a Cegueira antes de verem o filme. Depois não digam que eu não avisei...

Butterfly effect...


... ou a mania de gostar de borboletas na barriga...

13/05/2008

Mother's Day Secrets

Penso nisso recorrentemente. Como quando quis levá-la a Roma, e ela disse leva o mano.









E acabei por não levá-la a lado nenhum...




#: Post Secret
Expectativas em alta! Parece que desta é que é. E como disse a Ema,
GO BOOOOOYS!!!!!

09/05/2008

Ele avisou-me...

... que as pessoas iam ficar mais simpáticas. Que parvoíce, disse eu. E não é que ficaram mesmo? E não é que isso me irrita?




p.s.- Eu sei, a foto é horrível e de péssimo gosto. Por isso mesmo não resisti a deixar esta pérola, a aterrorizar os vossos pensamentos no fim-de-semana. I'm a bitch!

p.s.2 - E não, eu não era em NADA parecida com a bardajona da foto! DASS!

World Press Photo 2008

Balazs Gardi, Hungary

A man holds a wounded boy in front of a house in the village of Yaka China, in the Korengal Valley in north-eastern Afghanistan. The boy received shrapnel wounds from a rocket during a US air strike
on a suspected insurgent position in the village. After the strike, which villagers said killed and wounded a number of civilians, elders declared jihad on American forces in the valley.


Inaugura esta noite mais uma edição do World Press Photo. Está patente no Museu da Electricidade e pode ser vista até ao dia 8 de Junho.


É uma exposição ímpar. E impressionante é o facto de meia dúzia de imagens (vá, são 185) conseguirem com que me lembre da minha pequenez e impotência perante os acontecimentos que se dão neste imenso mundo. Por isso vá, mexam o rabinho desse sofá, larguem o computador e vão até lá.


Porque o mundo não gira à volta do nosso umbigo.

07/05/2008

O arroz ia girando na panela, sempre no mesmo sentido, à medida que ele o ia remexendo, paxorrento e distraído. Enquanto o fazia pensava nela. Em como o peito dela se insinuava sob a caxemira quase transparente com que chegara a casa nesse dia. Passavam-lhe números pela cabeça, facturas e clientes, o arroz ia girando na panela, o peito dela a insinuar-se na caxemira.

Sabia o quanto ela apreciava os finais de tarde a sós na varanda, nos quais se fazia acompanhar pelo martini que ele lhe preparava ainda antes dela chegar a casa. Sentia-lhe os passos nas escadas, o perfume no corredor, e logo a azeitona caia fundo no copo, seguida do líquido que ela adorava. E mesmo por saber o quanto ela apreciava esses momentos, mais tentado se sentia a percorrer o caminho que separava a cozinha da varanda. E a apertar-lhe o peito por debaixo da camisa de caxemira. E a tomá-la contra a parede.

Percorreu esse espaço a medo, tomou-lhe o copo da mão, pousou-o no chão com a delicadeza de gestos que lhe era característica, e tocou a caxemira. Logo debaixo da caxemira, o peito dela, sinuoso, insinuante, firme. Prendeu-a entre a parede e o seu próprio corpo. E teve-a, sem pensar nos vizinhos que a qualquer momento podiam surgir na varanda mesmo ao lado. Ou nos filhos, que a qualquer momento chegariam para jantar.

Do arroz, só se lembrou quando sentiu o cheiro a queimado.

06/05/2008

E tudo porque hoje senti saudades de Viena...

Alma Schindler foi das personalidades mais intensas e curiosas da elite vienense do início do século passado, e uma das mulheres da história que mais me intrigam. Para além de pintora e escritora, Alma era ainda uma mulher extremamente inteligente e de uma beleza que inspirava a inveja feminina e os desejos masculinos. De tal maneira, que foi musa de Gustav Klimt (a quem ofereceu o primeiro beijo) e Gustav Mahler, tendo-se envolvido também com Alexander von Zemlinsky, Walter Gropius e Franz Werfel.

De Mahler, recebeu o Adagietto da 5ª Sinfonia, prova de amor irrefutável pela beleza da composição. Já Oskar Kokoschka representou-a consigo na tela várias vezes, de que é exemplo a Noiva do Vento. Sem contar com as cartas de amor de Gropius e os manuscritos de Werfel.


Uma mulher que frequentou o Café Central (suspiro...), que passou por Lisboa fugida aos nazis e que passou os últimos dias em Nova Iorque.


Uma mulher que passou a vida rodeada por homens excepcionais, desde poetas, arquitectos, romancistas e artistas plásticos. É impossível deixar de admirá-la e invejá-la, mesmo decorrido quase meio século desde a sua morte.


E tudo porque hoje senti saudades de Viena...

Noiva do Vento, Oskar Kokoschka


Já tenho bilhetes!! :) Estou tão feeeeeliiiiizzzzz!!!

05/05/2008

És gay!? Que horroooooor!


Acho impressionante, descabido e repugnante, que ainda exista este tipo de hipocrisia no nosso país. Aparentemente, cerca de 70% da esclarecida população portuguesa ainda desaprova as relações homossexuais. E eu pergunto-me, COMO?! Acho ridículo e retrógrado as pessoas criarem juízos de valor baseado-se para isso na opção sexual da pessoal X ou Y. É que simplesmente não cabe na cabeça de ninguém. O que mais me surpreende, é haver uma distinção, ainda que mínima, no que toca à aceitação das relações homossexuais femininas e masculinas, sendo as primeiras melhores aceites. Quer isto dizer, homem com homem ai valha-nos Deus e os santos todos, que horror!, mas ver duas gajas bem boas a trocarem amassos a torto e a direito já pode ser, porque é giro, e excitante!

Outro aspecto surpreendente é o facto de, mesmo entre as camadas mais jovens, os valores da homofobia serem gritantes. O estudo mostra, e bem, que é por estas e por outras que ainda estamos na cauda da Europa. Basta comparar-nos com França, onde 80% dos jovens nada encontram de errado nas relações do mesmo sexo.

Tendo alguns amigos gays e sendo frequentadora de alguns sítios gay friendly, tinha a estúpida ilusão de que este estigma estava minimamente ultrapassado, não podendo por isso deixar de manifestar a minha indignação e vergonha perante estes números.

Repugnante.

Banksy está imparável. Dando bom uso ao enorme destaque que tem tido enquanto artista urbano, organizou um evento, “The Cans Festival - A Street Party of Stencil Art, para o qual convocou writers de todo o mundo a mostrarem o seu trabalho, num túnel ferroviário em Londres.


Alheia aos motivos que o levaram a promover tal evento, fica a certeza de que organizações deste género vêm dismistificar a street art, estigmatizada muitas vezes como puro vandalismo e destruição gratuita. Aliás, como afirmou Banksy ao The Times, O graffiti não estraga sempre os edifícios. Na verdade, é a única maneira de melhorar o aspecto de muitos deles.


O evento decorreu este fim-de-semana e terminou hoje. Resta agora conferir o resultado, que sem dúvida alguma deverá ter sido excelente.


Mais em Público

04/05/2008



Hoje seria o dia Dela. O dia em que me pediria para ficar com ela, e eu não teria tempo. Porque tinha que ir à praia, porque tinha que ir às compras, ou ir ter com alguém. Em que provavelmente jantaria qualquer coisa à pressa com ela por ter algo mais "importante" para fazer.


Irónico, como a importância passa a ser algo de completamente relativo quando perdemos quem amamos.


Para muitos, é mais um Dia da Mãe, mais um dia no calendário dos dias temáticos. Cá dentro, é um dia de arrependimento. E um dia em que as saudades crescem mais um bocadinho.





E a música que ela estava a aprender... e que eu amo*

30/04/2008


Mais uma noite zing zing ziiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiing :)

29/04/2008


Colocou o vestido de noite vermelho, calçou os saltos de agulha, pegou nas cigarrilhas e subiu os degraus, um após o outro, para o terraço. O terraço onde a avó lhe falava das gaivotas que vinham a terra quando havia tempestade no mar - a avó que vivera junto ao mar, a avó que se levantava com as galinhas para ir vender o peixe que equilibrava habilmente na cabeça. O terraço onde discutira futuros hipotéticos com a mãe e onde tirara as primeiras fotos em bebé com os primos do Porto que nunca mais vira na vida.

Ignorava por completo o ridículo a que a indumentária a sujeitava. Que disparate, numa casa em pleno campo, vestida daquela maneira absurda. Mas adorava coisas absurdas, que fossem contra os parâmetros daquilo que os outros delineavam como sendo normal. Pegou na cigarreira que herdara do avô - o qual nunca fumara! - e deu um trago no Don Pérignon Vintage que o irmão lhe trouxera da última viagem a França. Adorava aquele líquido magnético, dividido pelas nuances de frutas e minerais, maduro como gostava.

Deliciava-a imaginar o que pensariam os vizinhos, quando a vissem assim vestida, o barulho dos saltos altos a espalharem-se pela aldeia toc toc os cães a ripostarem contra aquele som cain cain, os sinos da igreja a assinalarem as horas dling dlong. Sentia os olhos deles insinuarem-se pelas frestas da janela, atraídos e simultaneamente inibidos pelo despudor dela. Quase que podia jurar ouvir os sussurros, o zun zun que despoletava. Libidinosa, a cor do vestido que envergava era quase herética. Tinha a certeza de que seria ostracizada pelos vizinhos. Mas pouco lhe importava. Depois de tudo ter perdido, pouca diferença faria ter ou não o apreço dos vizinhos.


#Imagem: Marcin Klepacki

Ele fez birra e bateu o pé e disse que nunca mais vinha ao meu blog, desde o episódio d'O Telminho tem bonus track nos pezinhos. Mas ele é um desbocado quando bebe demais, e na 6ª feira, cheios de cerveja e sol e muita água de piscina, ele descoseu-se todo. E admitiu que tinha lido e tinha gostado. E tentou, já meio inebriado, explicar aos amigos o que era um blog, e o quão bom era poder escrever o que se quisesse e ainda ter o luxo de ter uma comunidade que nos comenta e acompanha o que escrevemos. E fê-lo de uma maneira tão ternurenta e cheia de elogios, que não pude deixar de tentar me redimir daquele nosso primeiro episódio do bonus track.


Quando bebe, fica um bocadinho descontrolado, é verdade. Mas quando aquilo até corre bem, fica querido, faz-me massagens e chama-me bebé. Tão querido. É a única família que me resta.
E já merecia um post ternurento.

Cá fica, maninho. Adoro-te.*

28/04/2008

Passage du silence

Vi passar um bocadinho de silêncio. Corria, mas em bicos de pés, talvez porque era o silêncio em pessoa e não queria fazer barulho, sob pena de ver a sua reputação afectada. Fui a correr a ver se o apanhava, porque estava cansada do ruído fútil que a cidade me impunha.

Enquanto corri atrás dele, fui deixando um rasto de cacos, de chávenas e copos e pratos que se partiam atrás de mim. E a cada ruído desnecessário, sentia o silêncio a ficar cada vez mais longe de mim, e sentia a cabeça mergulhar num frenesim ensurdecedor que não entendia. Então tapava os ouvidos com os dedos indicadores, e fingia que dentro daquele zzzzzzzZZZZZZZZzzzzzzzzZZZZZZZzzzzzzzz interminável havia silêncio e silêncio e silêncio. Mas não, os dedos cansavam-se, caiam para o lado e adormeciam, e eu voltava a correr atrás da sombra de silêncio que às vezes passava por mim.


Vezes havia em que procurava abafar o ruído com as lágrimas. Mas o plim subtil das lágrimas a cairem-me no colo era quase imperceptível, e não chegava nem para abafar o zumbido irritante da mosca que estava presa entre os cortinados e a janela. E eu a fingir que estava tudo bem, que ia ficar tudo bem, que ia encontrar o meu silêncio. Mas era só isso, um fingimento disfarçado de lágrimas. E o ruído sempre lá, sempre à espreita, e o silêncio esquivo, fugidio, líquido.


Ainda hoje deixo-me ficar bem quieta, sossegada, à espera de ver o silêncio passar para lhe deitar as mãos. Mas ele passa sempre tão rápido, e eu sempre à espera de um dia conseguir apanhá-lo.