28/07/2008

Penso que cultivo tensões
como flores
num bosque onde
ninguém vai.

Cada ferida - perfeita -,
fecha-se numa minúscula
imperceptível pétala,
causando dor.

Dor é uma flor como aquela,
como esta,
como aquela,
como esta.










Incrível como as palavras nos derrubam, quando nos descrevem melhor do que nós próprios saberíamos fazer. Pequenez absoluta.





A FLOR, Robert Creeley
Trad.:Régis Bonvicino

Bom dia, Doutora. É o café do costume?

Sim, Miguel, obrigada.


Nunca tive destas mordomias. Mas mesmo não fazendo questão, mesmo não me aquecendo nem arrefecendo, o meu ego ficou estarrecido o resto do dia...



#Poema visual de
Marcelo Sahea

14/07/2008

1871... ou 2008?



O país perdeu a inteligência e a consciência moral.
Os costumes estão dissolvidos, as consciências em debandada, os caracteres corrompidos.
A prática da vida tem por única direcção a conveniência.
Não há princípio que não seja desmentido.
Não há instituição que não seja escarnecida.

Ninguém se respeita.
Não há nenhuma solidariedade entre os cidadãos.
Ninguém crê na honestidade dos homens públicos.
Alguns agiotas felizes exploram.
A classe média abate-se progressivamente na imbecilidade e na inércia.
O povo está na miséria.
Os serviços públicos são abandonados a uma rotina dormente.
O Estado é considerado na sua acção fiscal como um ladrão e tratado como um inimigo.
A certeza deste rebaixamento invadiu todas as consciências.
Diz-se por toda a parte: o país está perdido!

Eça de Queirós, “As Farpas”, 1º vol., 1871

#: ClaudioDeSousa


Um prédio atrás do outro branco amarelo rosa branco amarelo rosa azul e verde aqui e ali. Atropelam-se na tentativa vã de me encher a vista, até perder de alcance. O vento já não sabe ao mesmo, insosso, insípido, interior. Fecho os olhos. E esqueço-me de quem ao meu lado segura o volante. Por momentos, és tu quem viaja comigo. Fecho os olhos e poderia jurar que ralho contigo, mete a quarta, olha que assim o carro consome muito. E tu embrenhada nos teus pensamentos, nas tuas desilusões, nas tuas ambições perdidas. E eu a pensar que não quero ser como tu. Não quero ter sonhos por realizar, quero destacar-me, quero que te vejas projectada em mim, que vejas em mim a extensão daquilo que nunca chegaste a ser. Sim, puno-te pelas escolhas erradas que fizeste. Pelas vezes em que ficaste em quarta, em que hesitaste e nos castigaste pelas tuas escolhas. Eu não quero ficar em quarta, mãe. Não quero.

Fecho os olhos mais um bocadinho e imagino-te mais uns minutos. Os prédios e o vento são sempre os mesmos. Só a mão áspera que toco me traz de volta à realidade e sei que não és tu. Acabou-se o tempo das ilusões.

03/07/2008


Quando o computador avariou com inúmeros trabalhos lá dentro, fiquei a saber o que era fazer um backup. E depressa o fiz, para evitar futuras perdas. Quando a pen andou extraviada durante um mês, não perdi tempo em comprar mais duas, de 2 gigas cada, não fosse o diabo tecê-las. O mesmo com as fotos, quando o CD onde estavam gravadas ficou irrecuperavelmente riscado. Felizmente, mais alguém as tinhas algures. Mas entre numa tecnologia e outra, esqueci-me de fazer o backup ao coração. E entretanto, acho que lhe perdi o conteúdo algures. Talvez deixe um anúncio nos classificados.

01/07/2008

Yuppies de todo o mundo, uni-vos!


E se um dia para o outro, a gravata desse lugar a dois botões desapertados, e o casaco a umas mangas arregaçadas?

E os sapatos quadradões, às simpáticas all-star, bem coloridas?

Se de um dia para o outro, o dress code instituído fosse contestado, de um ao outro lado do planeta, originando um Maio de '68 do vestuário?

Pode parecer exagerado, mas agora que virei yuppie (só por fora, que cá dentro as convicções mantêm-se fiéis!), vejo o quão descabidos são certos valores instituídos em certas profissões. Dizem as entidades patronais que os empregados devem vestir-se à imagem dos clientes, e daquilo que os clientes esperam. Que um homem de t-shirt atrás de um balcão é pouco credível, e uma mulher de decote ou de alças ainda menos. Porra, se estiver um calor de morrer, pouco me importa se o homem está de t-shirt ou a mulher de burka! Desde que me atenda devidamente e dentro do esperado! Agora, obrigarem os colarinhos brancos deste e outros países fora a andarem fardados à medida do que o cliente espera, só porque está instituído, só porque é tradição, só porque se convencionou... Mas alguma vez perguntaram ao cliente como é que ele quer ver vestido quem o atende?? Eu também sou cliente aqui e ali, e a mim nunca ninguém me perguntou nada. Ligam a perguntar sobre tarifários, sobre detergentes, até sobre a put@ da tinta que uso nas paredes, mas ninguém me perguntou como é que eu quero ver os yuppies vestidos! Que não pareça que me preocupo com estas questões só porque agora estou no meio! Já antigamente me incomodava, principalmente ver os colegas do sexo masculino sem poderem sequer despir o casaco. Em função de algo de tão ridículo, que não está sequer escrito em lugar algum (a não ser nas normas internas das empresas).


Era bom que a deixa marxista pegasse, talvez o nosso dia a dia passasse a ser mais desafogado. E mais não digo. Vou-me despir.