18/02/2010

Como despachar um gajo em menos de nada





Não podia ser mais fácil. Requer alguma dedicação, é certo, mas tudo se resume a pequenas coisas que nós, gajas, adoramos fazer. Vibramos só de pensar nelas. Cá vai.




1. Tentar levá-lo a almoços, jantares, lanches, casamentos, baptizados, funerais... de família. Tudo o que envolva um contacto mais directo com os nossos progenitores, tios e tias que nem nós próprias gostamos de ver uma vez por ano que seja, e primos que nunca mais acabam, é meio caminho andado para pôr um ponto final no romance.




2. Olhar para bebés com ar enternecido, apertar-lhes as bochechas, ficar especada em frente a montras cheias de biberons e baby-grows. Só a mera sombra da paternidade a pairar-lhes na imaginação é o suficiente para darem corda aos sapatos mais rápido que o Obikwelu a fazer a maratona.




3. Fins-de-semana a quatro, double dates, e tudo o que possa envolver dois ou mais casais. Soa demasiado a aliança no dedo. Querem despachá-lo? Vão por mim, marquem o bendito fim-de-semana na Serra da Estrela e dou-vos uma semana no máximo para estarem a receber o fatídico e-mail do adeus.




4. Falar-lhe da casa dos nossos sonhos. Sim, aquele loft com uma parede toda em vidro e vista de mar. Imaginar-se lá dentro connosco 10 kilos mais gordas e os miúdos a correrem pela casa pode ter um efeito psicológico devastador para o comum dos homens.




5. Falar-lhe de sentimentos a toda a hora, e mandar-lhe sms's de bom dia, boa tarde, boa noite, dorme bem amor. Ele vai borrar-se de medinho ante estas investidas mais incautas.




6. Fazer dos primeiros encontros verdadeiras sessões de terapia. Nestes momentos, ele está mais preocupado em saber se vamos ceder aos seus avanços ou não. Pouco lhe importa se nos morreu o cão, se temos a avó no hospital ou uma unha encravada. Começar a chorar no meio do bar entre uma imperial e um tremoço? Remédio santo.




7. O facto de ele nos abrir a porta do carro para entrarmos, nos pagar uma refeição ou nos ligar para saber se estamos bem NÃO É SINÓNIMO DE RELAÇÃO. Se rolou alguma coisa, o mínimo que pode acontecer é ele ser simpático connosco. Comecem a agir como se isso fosse uma declaração de amor e acabam bem rápido sozinhas na sessão da meia-noite do Valentine's Day ali no Alvaláxia.




8. Se estão mesmo apostadas em despachá-lo, apareçam-lhe à porta de casa sem avisar, com uma surpresa qualquer. Deixem uma ou outra muda de roupa no armário dele. E claro, a inevitável escova de dentes no WC. A este ponto da narrativa, já não preciso de vos dizer o que vai acontecer, pois não...?




9. Encher-lhe o perfil do Facebook de coraçõezinhos e declarações completamente pegajosas. Ele vai adorar ter mais esse trunfo para usar contra vocês, e mais uma vez, puff, vão acabar sozinhas.




10. Acho que estou apaixonada por ti. A cereja no topo do bolo. É preciso dizer mais alguma coisa...?




12/02/2010


O papel e o tabaco já quase queimados na totalidade, o filtro a aproximar-se vertiginosamente. Resta-lhe pouco tempo para a decisão final. Dar ou não aquele último bafo que sempre lhe fica a faltar, já mesmo em cima do filtro.

Tal como em tudo na vida. Dar ou não o salto.

06/02/2010






O amor.



Porque no fim de contas, tudo se resume ao amor. Ao que temos. Ao que nunca tivémos. Ao que desperdiçámos. Ao que perdemos. Ao que não temos a quem dar, ao que nunca recebemos. Do amor e da sua existência ou ausência se rege a nossa vida. Poderemos algum dia ser felizes se não formos amados? Não. E na mesma medida em que o amor em excesso nos pode asfixiar, também a sua falta pode ser sufocante. De uma forma fatal.



Pudesse eu viver sem amor, e a meus pés teria o mundo estirado, pronto a ser consumido no seu estado mais bruto. Mas não posso, não posso viver sem amor. E admitir esse tremendo defeito de fabrico que acompanha o homem desde o seu primeiro segundo de vida, é já um primeiro passo rumo à liberdade. Reconhecer para mim mesma esta insaciável necessidade de amor é como expulsar de dentro um dos muitos demónios. Olhar-me no espelho e perguntar-me se alguma vez fui verdadeiramente amada. Ou se serei apenas demasiado exigente...



Preciso de expurgar esta minha dependência doentia, que me tem amarrada como alguém em estado terminal preso a uma cama de hospital. Malditos pensamentos, malditos sentimentos, maldita consciência. Fora eu cronicamente acéfala, e dificilmente me consumiria nestes devaneios existencialistas.

04/02/2010

ULTIMATUM






A fortaleza começou a desabar.



As fraquezas a vir ao de cima.



Anos e anos a fio a camuflar nefastas negligências, a ocultar sentimentos de raiva e de ódio. Ei-los todos a desafiarem-me em catadupa, eis-me em rota de colisão directa com eles. E agora não há volta a dar.



A farsa da tranquilidade deixou de funcionar. O peso de anos de solidão tornou-se demasiado nítido, mais do que eu posso suportar.



Agora? Fazer das tripas coração e decepar este nó na garganta que por tempo demais me segurou as palavras, os gritos, a raiva.



O objectivo? Encontrar a autonomia que me fiz crer que tinha e que afinal nunca esteve verdadeiramente dentro de mim. É uma luta a sós. Uma luta contra os monstros do passado. Deixar de os contornar para os destruir. Um após o outro. E vai doer como talvez nunca tenha doído antes. Mágoas que escondi e que chegam agora fora de horas, prontas para DOER ainda mais.



Talvez saia mais forte deste exorcismo tardio. No pior dos cenários, mais fraca do que quero sequer imaginar. Vai haver muito sangue, e não sei se vou sair inteira desta guerra. Mas vou entregar-me por inteiro a cada batalha. Venha o que vier, a fortaleza tem que ser reconstruída.

02/02/2010

Para quando acordares


As primeiras luzes da madrugada entram tímidas janela adentro, beijando-te a pele cândida. Jazes a meu lado (in)consciente da tua imperial beleza, despida como vieste ao mundo, tranquila no teu invulgar sono.


Não posso mais consumir-me nestas noites em que tu és rainha, em que impotente me apago perante a tua soberania indiferente. Nunca vi uma pele tão pura que contivesse em si um ser tão devasso, tão alheio aos sentimentos de quem a ela se subjugue. Tens-me na palma da mão e usas-me a teu bel-prazer. Sei-o e a muito custo o admito para mim, pago caro esta dependência. Sinto vender a alma ao diabo, noite após noite. E tu indiferente, do alto do teu pedestal, intrépida consumidora de auras alheias.


Oxalá pudesse redigir-te estas palavras sem a pressão de conjugar género algum. Mas inevitavelmente sei que sou tua e dessa tua pele impiedosamente devassa, assustadoramente viciante. Jogo perigoso, este da entrega que jogamos. Perigoso para mim, que continuarei súbdita, reles plebeia dos teus desejos inflamados, para um qualquer dia acabar esquecida numa latrina infesta.
Vender-me-ei mais uma vez esta noite para depois cair novamente no abismo das incertezas, prostituta sentimental que sou.


Uma reles puta.