31/01/2008

Do amor num FIAT Tempra...

A estação era a do Parque Eduardo VII. Seriam cerca de 21h17.

Tit. Tit. Tit.

As portas da carruagem abrem, Ele sai, agita o lenço de estilo palestiniano de cor vermelha, cruza o olhar com o Dela. Ela entra na carruagem, pára à frente Dele e ficam a olhar-se como se fosse a primeira vez que se viam. Alguns segundos depois, beijam-se com uma paixão que é raro ver nos transportes públicos (a não ser entre crianças de 15 anos a quem mal nasceram os púbicos e que acabam de descobrir a genitália).

Gostei daquela maneira sui generis de se reencontrarem. De se beijarem. Até porque, atraentes como ambos eram, a cena poderia ter sido retirada de um qualquer filme europeu (vá, desde que não fosse português): rostos bem delineados, bonitos, ambos vestidos num estilo urbano italiano irreprensível, perfumados. Fingiram que não se conheciam, que não tinham qualquer intimidade, e depois, contra todas as espectativas, PUMBA, beijam-se, assim, sem mais nem menos.

Gostei.


Alguns minutos depois, por volta das 21h26, repito a experiência que tenho vivido nas últimas semanas. Saio do metro na saída Praça de Espanha/Av. de Berna e lá estão eles, dentro do FIAT Tempra, que deve ser de 1990. Ela, ar de brasileira ilegal de meia idade, acabada de chegar do outro lado do Atlântico. Já Ele não engana ninguém com aquele ar de transmontano. Deve ser proprietário de um qualquer latifúndio a Norte. A mulher deve estar em casa a secar enchidos ao fumeiro. Ou então com o rabo gordo em cima do balcão da Padaria Central, cheio de farinha, porque quase de certeza que anda enrolada com o padeiro nas horas vagas, nas horas em que o marido tem "reuniões de negócios" em Lisboa com a brasileira.



(Esta é a mulher do senhor. Castiça, não é?)








E os filhos, ou ajudam na labuta no campo, ou já andam a ganhar 18,50€/hora na construção civil em Espanha, tão na voga lá para aqueles lados. E, com alguma sorte, ainda arranjam uma fresta ao fim de semana para irem às meninas a Bragança. Quem sai aos seus não degenera.

Voltando ainda ao FIAT Tempra, eles não falham. Estão lá todos os dias, quando eu passo às 21h26. Com tantos locais estratégicos em Lisboa, com tanto quarto a 20€/hora no Saldanha (com direito a duche deslavado e TV "Cabo", segundo vim a saber nos classificados do Correio da Manhã), e eles vão-se pôr mesmo ali, onde passam pessoas de família como eu. Na saída do Metro! E depois trocam umas lambidelas de mão muito esquisitas, muito lamechas, muito de amantes. Eu nunca tinha visto nada do género. Encolhem-se nos bancos da frente e ali ficam, a lamber as mãos um do outro. Os carros que vão para o Viaduto Duarte Pacheco de um lado, os drogados e bêbados que por lá andam do outro, e eles, amantes, ali no meio. Coisa sem gosto nenhum. Chucrice que acontece quando se mistura Brasil e Trás-os-Montes!

Há pessoas mesmo estranhas.




Post Scriptum - Façam a experiência. Quando passarem no metro da Praça de Espanha às 21h26, procurem o FIAT Tempra, que há-de lá estar. A não ser que eles mudem de sítio. Nesse caso, por favor, aceitem as minhas desculpas!

3 comentários:

RC disse...

Eu voyer me confesso: vou mesmo espreitar!

Quanto ao metro, também me confesso: ela por acaso não era loira?

Xi.

Jaime disse...

Muito bem apanhado, este contraste entre os globalizados glamourosos e os globalizados sórdidos! Acho que "lamber as mãos" é a tradução transmontana de "safe sex".

Ema disse...

iiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiiii.
"deu merda".