18/03/2008


Uma semana depois de um silêncio inexplicável, o telefone dela tocou. Gostava de saber se ainda me emprestas o mapa de Berlim e os guias. Atónita, sentiu-se estremecer quando o nome dele surgiu no visor do telemóvel. Sim, podes passar, vou estar em casa. Mas não sabia com que forças iria abrir a porta, com que postura, com que dignidade. Depois do silêncio que a massacrara durante toda a semana. Não fora de ânimo leve que a ignorara durante aqueles 7 dias. Cicatrizes passadas levavam-no inconscientemente a adoptar esse tipo de comportamentos, como se colocasse um penso numa ferida já sarada. Só por precaução, não vá a ferida abrir outra vez. Mas ela desconhecia esse padrão próprio só dele, e deixara-se ficar, inibida pelos seus próprios medos e frustrações.


Ele pintara para distrair o pensamento da linda cabeça encaracolada dela. Ela dançara pelo quarto agarrada ao Ipod, procurando abstrair-se do intelecto dele, que achava tão irritantemente sexy.


O mapa e os guias eram o único pretexto convincente que ele encontrara para poder abordá-la de forma discreta e pouco óbvia. Ao que ela naturalmente anuira, pois também queria saber o que o desenrolar da história lhe reservara.


Horas estranhas eram apanágio dele. Coisas de artista. A campainha soou ainda não eram 4h da manhã, apanhando-a desprevenida, chávena de chá na mão direita, cigarro na outra. Abriu a porta a medo, curvada sobre si tal era a ansiedade que lhe pesava. Ele, intuitivo que era, sentiu-lhe o tremor involuntário e apeteceu-lhe abraçá-la, apertá-la contra si, fazê-la perceber que ele sentia o mesmo. Impelido por esse desejo, recalcou-o no mais fundo de si. Olá, E. ... Tens um chá para mim também? Ela esboçou um sorriso, ele passou a soleira da porta, e deixaram-se cair no sofá.


Até de manhã.

12 comentários:

Ema disse...

que familiar que isso me é.
e que bem que tu escreves.

em vez de ter "uma lágrima no canto do olho", tenho um sorriso na ponta do lábio. *

pegueitrinquei disse...

Eu sei que tu sabes* Obrigada por (tu sabes)...

Beijo*

Anónimo disse...

mulher, tu escreves maravilhosamente.

tb tem qq coisa de familiar cmg, ou então sou eu hj que estou estupidamente susceptível e tudo me faz lembrar tudo.

heh...

Unknown disse...

Os artistas, os artistas...;) Gostei dela. (e nem por acaso, estas férias passarei uns dias em Berlin)

beijo

Maria del Sol disse...

Gosto da perspicácia com que desconstróis as razões do coração. É graças a posts como este que me sinto feliz por passar várias vezes seguidas pelo teu blog. :)

Cláudia Sampaio disse...

Os artistas são do caraças... porque é que também me revi neste texto? Café para quando?

Anónimo disse...

nem de propósito...chavena de chá na mão esquerda e cigarro na mão direita;)
adoro ler-te menina do nome esquisito...vou-me lendo e relendo nas entrelinhas! pinta o amor nas paredes...pinta-o onde sentires vontade...mas sente-o!;)
beijinhossss

Jaime disse...

Isto está muito bem apanhado, muito bem escrito, muito bem descrito. Parabéns.

Ema disse...

está isso tudo. mas para mim ainda está melhor.

pegueitrinquei disse...

Para ti está melhor, Ema, porque tu sabes. E são mesmo muito pouquinhos os que os poderão sentir como nós. Praí uns 2 ou 3 =)

Ema disse...

2 ou 3, sim.

rv disse...

coragem p todas as histórias de amor, seja qual for o final,


:)