28/03/2008

o meu ego às vezes faz beicinho



#Imagem:
Nana Sousa Dias

Uma lição de vida, By Bad




A Bad postou no seu Bad Girls Go Everywhere (um excelente blog, que recomendo) uma espécie de análise antropológica das relações homem/mulher, vale a pena conferir. Ora vejam.

Glossário - II

Nas lides circenses, a arte de "rodar pratos", a.k.a. "pratos chineses" é uma forma de malabarismo. Na vida real também."Rodar pratos" é algo que todos fazemos, mais ou menos conscientemente, em dadas alturas da nossa vida. Como sou mulher, o exemplo será dado à minha imagem. Adaptem como vos aprouver. Se vos aprouver.Na imagem vemos a malabarista (a mulher), os pratos (os homens) e os paus (certamente têm um nome mais técnico...) que apoiam os pratos (telefonemas, sms, jantares, conversas de msn, ...). Os pratos que estão a ser rodados não podem ter qualquer tipo de valor sentimental para nós. Se os desequilibrarmos e deixarmos cair um, ou dois, ou mais, é só substituir. Não podemos ficar a chorar e a olhar para os cacos no chão. Não há tempo. Assim os outros cairão. Não podemos dar-nos ao luxo de deixar isso acontecer...Não pensem que pode qualquer pessoa fazer destas proezas... é preciso técnica, precisão, destreza, visão periférica... É rodar cada prato com a força certa. Nem com demasiada força nem com brandura exagerada. É o toque certo. É estar a rodar o prato 3 e perceber que o prato 5 precisa de um jeitinho. É um sms na altura certa, um telefonema conveniente. Nem de mais, nem de menos. Há quem consiga dois pratos. Há quem consiga dez. Nem todos somos artistas. Nem todos sabemos rodar dez pratos com destreza.Estes pratos não podem ser recuperados. Não servem para fazer parte do serviço de louça lá de casa. Têm a forma errada para isso. Servem apenas para ser rodados até caírem ou até nos cansarmos da "brincadeira". Olharmos para o lado. Vermos que há mais coisas à nossa volta.Há alturas em que não nos queremos comprometer. Nem sequer pôr tijolinhos... Só flirtar. O tempo todo. Manter dois, quatro, seis flirts em suspenso. Nunca deixar de rodar os pratos. Porque no dia em que deixarmos de telefonar, jantar, flirtar... Kabam! Caiu? Temos pena, de onde este veio há mais!...Claro que isto é tudo muito bonito, mas só até ao dia em que compramos um fantástico conjunto de pratos numa Vista Alegre da vida e não queremos (podemos!) parti-lo...Num próximo post-glossário abordaremos a expressão "síndrome da gata paraquedista (ou pára-quedista)"...


A mulher é uma Bradshaw ou não?
Depois de computadores e televisões, Raul Castro autorizou os cubanos a possuírem telemóvel, um bem até agora apenas acessível a estrangeiros e funcionários governamentais. (Público)

Não me digam que o senhor não foi um querido!!

Mrs. Melancholy


O truque de Beth Gibbons é quase imperceptível. Mas uma jogada de mestre. A roupa escura, o corpo curvado, o ar low profile. Tudo conjugado de forma a que a sua voz intocável seja a protagonista da noite. Sempre de mãos pregadas no microfone, o magnetismo é inevitável, a sua aura frágil e melancólica atrai de tal forma que é impossível desviar dela o olhar. Tudo em perfeita simetria com um jogo de imagens irresistível, iluminação intimista q.b., e um desempenho incontestável dos músicos de Bristol.


Impressionante o extâse respeitador do público, que seguia o dedo erguido de Beth, sempre que se impunha o silêncio. Um silêncio espontâneo, colectivo, automático, sintomático da espera - de 10 anos para alguns, de uma vida para outros.


Melancolia servida em estado puro, em saborosas doses industriais.


Nota ainda para a óptima observação de Gonçalo Frota, do Sol, a primar pela ausência de falsos moralismos: Como prova de que fora dado o tiro de partida oficial para o prazer dentro de portas, aquilo que se sentiu no ar de imediato foi outra coisa: o aroma a erva.


Fica a sugestão para mais um concerto de um dos cantautores mais promissores da nossa geração. Apareçam!

27/03/2008

Quando ele chega, já vai com a boca cheia de comida. Geralmente chocolates ou bolachas. Todos os dias, sem excepção. Antes de eu começar a dieta, se tivesse comida visível, ele pedia-me se podia tirar, com um entusiasmo próprio de alguém que executa dada tarefa pela última vez na vida. Transpira que nem um porco quando faz calor e está gordo. Sinto-me mal por me enojar cada vez que o vejo comer. Mas enoja-me. Provoca-me vómitos, sinto que vou bolçar (*) se não desviar o olhar de imediato. Principalmente pelo regozijo com que ele se entope de porcarias, goela abaixo. Se por alguma fraqueza da carne, dou por mim a comer algo que me foi proibido, lembro-me dele de imediato e sinto esse nojo percorrer-me de uma ponta à outra do corpo.

Há um outro que usa umas camisas aos quadrados estranhas, e uns mamarrachos num ouro que de verdadeiro, aparenta pouco. A esse, também tenho vontade de o trucidar, trespassar, fuzilar. É provinciano, é bimbo, é um verdadeiro borgesso, na plena acepção da palavra. A calcinha em sarja azul céu, a camisinha de farmer americano, o sapatinho quadradão, os ouros... É demais até para uma gaja tolerante como eu. Cada vez que abre a boca para falar, qualquer som grunhido por aquele homem me dá vontade de o mandar pela janela abaixo, esperando que se estatele e fique bem partidinho.


Tenho este dom especial de odiar assim as pessoas.


Cabe informar que este dom é-me intrínseco, mas tem sido reforçado pelo meu desequilíbrio hormonal.


(*) E para não ficarem com a sensação de que este é um blog onde se achincalha gratuitamente e pouco ou nada se aprende, fiquem então com uma pequena lição GRATUITA sobre o acto de bolçar. Para além de ser um vocábulo que adoro, adorei a minuciosidade com que é descrito o acto em si. Ora então deleitem-se:

Bolçar, também denominado regurgitação, é um problema comum nos bebés. A maioria dos bebés bolça pelo menos ocasionalmente e alguns bolçam a todas as mamadas. Quer os bebés que são amamentados a peito, quer os que são alimentados a biberão, bolçam.
O bebé pode bolçar algum leite misturado com saliva e mucosidade quando está a arrotar ou a babar-se, especialmente quando comeu mais do que o seu pequeno estômago consegue suportar. Se o leite chegou apenas até ao esófago antes de ser regurgitado, terá o mesmo aspecto que tinha quando o bebé o bebeu. Mas se o leite já tinha chegado ao estômago antes de voltar para trás, terá um cheiro azedo.


Não é lindo?
As minhas hormonas parecem ter atingido valores históricos.

Como se não bastasse, hoje entrei DUAS HORAS mais cedo e estou com 4 HORAS de sono.

A piorar a situação, parece que alguma entidade divina decidiu castigar-me pelos erros que terei cometido nesta e noutras vidas, espalhando aos quantro ventos que caso seja:
A) Burro que nem uma porta

B) Estúpido que nem uma besta

C) Mal educado como tudo

D) Uma puta esquizofrénica a la mode de Cláudio Ramos

...ligue para h4rddrunk3r e chateie-a só mais um bocadinho!

26/03/2008


10h da manhã, e as primeiras palavras dele para mim: Mana, quanto tempo dura a menstruação?




...#%&?€@...



Mais ou menos 4 dias, na pior das hipóteses, uma semana inteira! Mas porque raio queres saber isso?


E ele, parvinho como é (sai a mim!) Porque ando com dores menstruais há 4 dias...


Isto numa altura em que ando bem chateadinha com as vicissitudes inerentes à condição feminina, por si só nem sempre vantajosa. Nem é tanto a menstruação em si que me chateia, mas os dias que a antecedem, a maldita Tensão Pré-Mentrual, aka TPM. É que até uma gaja rija como eu fica sensível, fica vulnerável, carente e irritadiça. Até simples questões ou pedidos como Viste as minhas chaves? ou um Podes estender a roupa? podem dar azo a uma valente discussão, entremeada com uns bons berros e seguida de um amuo que pede chocolate em doses pornográficas.


A sério, eu nem me importo de andar carregada de Evaxs e OBs para todo o lado, mais os Trifenes e o diabo a sete, mas era mesmo necessária esta estúpida vulnerabilidade??


P.S.: E sim, mano, eu sei que essa perguntinha tem a ver com a tua namorada... Ai ai, os 18 aninhos...

25/03/2008

Adenda

Como se já não fosse suficientemente bom ter conseguido os bilhetes após estarem esgotadíssimos, ainda vou ter direito a uma boa dose de música balcânica. Desconhecia a existência dos senhores A Hawk and a Hacksaw, que irão abrir Portishead. Mas depois de uma pequena investigação, parece que a sonoridade vai bem de encontro àquilo que gosto de ouvir, com direito a acordeão e violino pelo meio. Se bem que fiquei um bocadinho desconfiada desta escolha, que pouco tem a ver com o som dos Portish.

Mas as expectativas estão altas, a ver vamos!






Desculpem lá se ainda consegui comprar bilhetes

24/03/2008

HOJE PASSEI O DIA A FAZER DAS TRIPAS CORAÇÃO


Queria arrumar a vida. Pôr os papéis nas pastas certas, pintar as paredes, fazer o IRS, arrumar os cds, comprar cortinados e tapetes novos, pintar as unhas, arrancar os posters das paredes, as colagens, os Dali's, desfazer-se das roupas largas, comprar um carro novo, uma casa na Baixa, esquecer as dívidas por receber, as pessoas de quem não conseguia deixar de gostar, as pessoas que a viciavam. Pôr um ponto final na vida cinzenta. E começar uma vida cheia de arco-íris.
Momento raro no nº 3 da Via Marcantonio Odescalchi: Domingo de Páscoa e nem vivalma pela casa. Uns para Sul metidos em almoços de família, outros a Norte, enfiados numa qualquer fila de museu em Florença. E eles os dois, com a casa só para eles. Porque a ocasião assim o justificava, lá cederam ao cliché: acordaram a horas (para eles) pouco próprias e lá rumaram à Piazza San Petro, ouvir a benção papal num português abrasileirado mal ruminado. Cumprido o ritual, voltaram a casa ensonados, sozinhos, deixados para trás por todos os que tinham ido de férias. Dividiram as horas entre o sofá e a cama, entre goles e bafos inconsequentes, vestiram-se e despiram-se vezes sem conta, até cairem no marasmo de um Domingo de Páscoa atípico e muito pouco católico. Lembraram-se de apanhar o comboio da meia-noite para Veneza, passarem lá o dia. Boas intenções, óptima ideia. Mas deixaram-se cair mais um pouco no sofá, indefinidamente, menos uma peça de roupa, mais um beijo (pouco) inocente no pescoço. Mais um cigarro, mais um copo de vinho, e a roupa sempre em desvantagem. E o tempo a passar. Quando finalmente conseguiram sair de casa (leia-se sofá), quando finalmente conseguiram soltar os lábios da pelo um do outro, lá foram para a fermata, onde esperaram por tempo indeterminado o tram que os levaria a Termini e, por fim, a Veneza. Mas o tram nunca mais chegava. Nem eles chegariam a Veneza. Resignados, lá voltaram a casa. Resignados, lá tiraram a roupa mais uma vez. E puseram fim ao Domingo de Páscoa menos ortodoxo de sempre... nus.

20/03/2008

Beatriz, a movie maker

A informação entrou-lhe a um velocidade alucinante, sem paninhos quentes, sem mãos na cabeça. Glup, engoliu em seco, pegou no copo e de um só trago engoliu a pouca água que restava, numa vã tentativa de se recompor. Letra após letra, viu o e-mail da Catarina aparecer no histórico de logins do e-mail dele. catarinaluz@coolkiwi.com . Assim, ali exposto, entalado entre os e-mails dele e dela. Arrependeu-se de imediato dessa ideia peregrina de lhe ter pedido para usar o computador. Desejava, com todas as suas forças, não ter visto aquilo. O sinal óbvio de que ele não estava pronto para esquecer a Catarina, aquelas letrinhas ali direitinhas, catarinaluz@coolkiwi.com. Imaginava-o prostrado perante o monitor, estático, e o cursor indeciso a apontar a palavra que mudava tudo: Esquecer-me. Eliminá-la do seu histórico, simplesmente. Clickando em Esquecer-me, não teria que deparar-se com o nome da Catarina nunca mais. Ainda pensou em fazê-lo. Mas ele iria reparar, certamente, e podia não gostar dessa ousadia dela.

Ignorou.

Fez o login.

Viu o e-mail.



E meteu-se na cama com ele.

____________________


Beatriz tinha a mania de construir pequenos filmes, que iam passando na sua cabeça, lentamente, um após o outro. Relatos onde ela era a personagem principal, realizadora, produtora, argumentista. O último fizera-o quando estivera em casa dele naquela semana. Quando abriu a página para ver o seu e-mail e ainda lá estava o e-mail da Catarina. catarinaluz@coolkiwi.com. Normalmente não se sentiria incomodada, eram-lhe indiferentes estes pormenores. Mas ela era Beatriz, a movie maker. E só para si, representou mais um trecho, mais um take da mulher apaixonada não correspondida, cujo coração esmorece e se aperta perante o e-mail da adversária. catarinaluz@coolkiwi.com. Fingiu a banda sonora adequada ao momento, uma música de despedida lamechas que ele dedicaria à Catarina, fingiu a mágoa daquele nome que a feria, fingiu a paixão que sentia por ele, fingiu a dor por ela não esquecer a Catarina.
O problema é que a Beatriz fingia tanto, que às vezes dava por si a tentar entender se determinadas situações tinham sido realidade ou mais um fruto da sua feroz imaginação, Beatriz, a movie maker.


Fez o login.

Viu o e-mail.

E meteu-se na cama com ele.

19/03/2008


O primeiro passo só é o mais difícil se tu deixares.
Sempre que ela entrava, pontualmente, às 9 horas de cada dia, ele ficava suspenso pelo perfume, pela aura que ela deixava à sua passagem. Fazia meses que ficava sempre suspenso, pontualmente, às 9 horas de cada dia, de olhar preso nos cabelos, nas mãos, no corpo dela. Arrastava há meses essa fraqueza que degenerava em indecisão. Abordá-la ou não. Sentia-se intimidado pela força da presença dela, carismática, imponente. Mas amanhã seria diferente, amanhã pontualmente, como às 9 horas de cada dia, mas amanhã seria o primeiro dia do resto dos dias. Aproveitaria a primeira paragem dela, para o café, para se lhe dirigir. Pouco idílico, de facto, mas já pouco lhe importava. Queria tocar-lhe, sentir-lhe a pele que exalava um ligeiro odor a pêssego, levá-la a casa, fazer-lhe o jantar, deitá-la no chão, tê-la só para ele. E quem sabe, o resto da vida.

Imaginou começar essa vida com ela naquele banco em frente ao lago, aquele entre as duas árvores que abraçava em criança, sedento do mundo. Comparava a aura dela à mística do lago, ao silêncio assombroso que dominava aquele espaço de árvores, de água, de gente, e um bocadinho seu também. O lago que sempre transbordava quando a chuva desabava impiedosa dos céus, inundando de destruição os terrenos adjacentes.

O telefone da secretária ao lado da sua tocava insistemente, sem ninguém que o atendesse. Eram 8h59, ela devia estar mesmo a chegar. O telefone continuou a tocar, sem ninguém que o atendesse. 9 horas em ponto. E nem sinal dela. Sentiu um tremor estranho percorrê-lo. Talvez da ansiedade de ser hoje o dia. O telefone continuava a tocar, até que alguém finalmente o atendeu.



(...)



Um suspiro profundo e alguns segundos depois, as palavras proibidas finalmente pronunciadas: O carro da Vitória foi abalrroado nas cheias ontem à noite, quando ia para casa. Encontraram o corpo esta manhã na beira do lago, junto ao banco entre as duas árvores.




#Imagem: miguel pereira

Dia do quê?

Se durante 18 anos, a palavra "pai" tivesse sido para mim mais do que um nome no bilhete de identidade, provavelmente hoje dedicar-lhe-ia esta música de K's Choice que adoro desde miúda. Go figure...



I was a kid, you were my dad
I didn't always understand
I wanted freedom, you got mad
You were concerned, I got upset
I didn't recognize you yet

And did you cry, I know I did
When I lied to you
I didn't want to hurt you
I just never knew I did



You never told me that you loved me
I know you didn't know how
I guess that shows we're much the same
'Cause I love you too and until now
I've never said those words out loud
I hope you're proud
To be my dad...


What are your secrets, do you pray
Is there a god that shows your way
I wish I knew...
Do you have crazy fantasies
What happens in your dreams
I want to know...


I guess you'll always be a mystery to me
But you taught me how to value life
And what else do I need
I have a dad who watches over me


P.S. - Sei que tu
talvez fizesses o mesmo também. E tu... E ele também...

Vamu rrreeebentarrrr essi mambo!!!

Ontem foi assim, só abanar o rabinho =)

18/03/2008

E se eu pudesse pegar no amor e espalhá-lo nas paredes?



Uma semana depois de um silêncio inexplicável, o telefone dela tocou. Gostava de saber se ainda me emprestas o mapa de Berlim e os guias. Atónita, sentiu-se estremecer quando o nome dele surgiu no visor do telemóvel. Sim, podes passar, vou estar em casa. Mas não sabia com que forças iria abrir a porta, com que postura, com que dignidade. Depois do silêncio que a massacrara durante toda a semana. Não fora de ânimo leve que a ignorara durante aqueles 7 dias. Cicatrizes passadas levavam-no inconscientemente a adoptar esse tipo de comportamentos, como se colocasse um penso numa ferida já sarada. Só por precaução, não vá a ferida abrir outra vez. Mas ela desconhecia esse padrão próprio só dele, e deixara-se ficar, inibida pelos seus próprios medos e frustrações.


Ele pintara para distrair o pensamento da linda cabeça encaracolada dela. Ela dançara pelo quarto agarrada ao Ipod, procurando abstrair-se do intelecto dele, que achava tão irritantemente sexy.


O mapa e os guias eram o único pretexto convincente que ele encontrara para poder abordá-la de forma discreta e pouco óbvia. Ao que ela naturalmente anuira, pois também queria saber o que o desenrolar da história lhe reservara.


Horas estranhas eram apanágio dele. Coisas de artista. A campainha soou ainda não eram 4h da manhã, apanhando-a desprevenida, chávena de chá na mão direita, cigarro na outra. Abriu a porta a medo, curvada sobre si tal era a ansiedade que lhe pesava. Ele, intuitivo que era, sentiu-lhe o tremor involuntário e apeteceu-lhe abraçá-la, apertá-la contra si, fazê-la perceber que ele sentia o mesmo. Impelido por esse desejo, recalcou-o no mais fundo de si. Olá, E. ... Tens um chá para mim também? Ela esboçou um sorriso, ele passou a soleira da porta, e deixaram-se cair no sofá.


Até de manhã.
Calma...




Respira...

Conta até 5...


Venho agora da copa do meu trabalho, onde se encontram dois exemplares de proporções gigantescas, semelhantes ao da foto. Não seria nada de grave, não fosse o facto de eu ainda estar a fazer a fuckin' dieta e não poder comer!!!
Ficam já a saber que odeio pessoas que nascem com o metabolismo perfeito. F*ck!








Desculpem lá se já perdi 5 kilos!

17/03/2008


A cama era grande, branca, infinita, imaculada. Estendia as mãos e nunca conseguia alcançar a outra ponta da cama. O mesmo acontecia quando estendia os braços para ele. Quanto mais estendia os braços, maior era a cama, maior a distância entre eles.


Fumava o cigarro alheia ao corpo dele, enquanto o fumo desenhava o ar abstracto. No marasmo que inundava o quarto, só a mão dela descrevia movimentos, lenta, acima e abaixo, levando à boca mais um pouco de vício. Apeteceu-lhe pedir que não voltasse. Nunca mais. Mas não era capaz. Ele viciava-a mais do que a nicotina.


14/03/2008

Post Scriptum para Momento esquizofrénico do dia #2

Será que o elevador tem mesmo câmaras? Há pouco baixei-me para compor a bainha das calças e fiquei com o rabo todo de fora!!! Pânico!

Hot&Not

Vamos lá aqui a esclarecer umas coisinhas. Sou uma gaja que não gosta de clichés. Já sabem disso desde que aqui afirmei não gostar de receber flores. Da mesma maneira que fico constrangida se me levam a jantar fora ou se me fazem surpresas.

Exemplo prático: No sexto ano, um dos meus melhores amigos declarou-se e ofereceu-me uma rosa (blheeeerg!). Estive até ao final do período sem lhe conseguir falar. Got it?

Bom, voltando ao que interessa. Não gostando dos ditos clichés, também faz parte do meu rol de coisas abomináveis as revistas femininas. Vogue, Cosmopolitan, Máxima. Por variadíssimos motivos! Um dos principais, é por presumirem que o universo de leitoras que as compra fazem parte de uma classe média alta na qual eu e 99,9% das pessoas que conheço não se enquadra. Logo, não vou ter 1.397€ para comprar a fantástica mala da Prada que lé vem, ou o floral Kenzo por 3.869€. Sim, iam ficar fantásticos nesta minha maravilhosa silhueta, mas jamais caberiam no meu orçamento. Pelo menos enquanto eu não tiver um rendimento líquido mensal de 5.000€.

Outro motivo, é por causa das barbaridades que por lá se escrevem nas páginas dedicadas às últimas tendências. Fiquem então a saber que as cadeiras estilo Luís XIV estão muito em voga, mas que os budas, ideais para o tempo frio, devem ser arrumados no canto mais recôndito da dispensa. Depois, desistam de fazer pandam (caso não conheçam o termo, significa combinar cores e usa-se muito no Oeste) entre malas e sapatos, porque isso está super out. Por último, é muito pouco chique sair à noite sem levar um clutch. Se estão a torcer o nariz, eu fiz o mesmo, pois em 23 anos de existência nunca tinha ouvido falar em tal coisa. Parece que é uma coisa minúscula para pôr coisas também minúsculas (tipo uma chave, uma nota de 50€ e um O.B. - o essencial para se sair à noite, portanto).
Ou seja, este ano é para esquecer ter budas expostos em casa, sair sem clutchs e combinar cores.


Fuck, vou estar tão out!

Percebem agora porque detesto clichés?

Merdas que me irritam!

Quem é que me manda a mim ir ao Minipreço comprar produtos de marca branca????

Queijos frescos e iogurtes líquidos: a película de alumínio sai a um custo tal que há bocado tive que partir uma unha para matar a fome. DASS!

Mais um estudo antropológico barato

Não deixo de me espantar com as notícias que nos chegam do outro lado do mundo. Espaços de chill out, zonas lounge, espaços para fumadores. Tudo isso parece ficar algures num passado distante, com a conotação de "pequenos lactentes", quando comparados com a iniciativa da Hime&Company. Esta empresa nipónica decidiu pagar férias aos seus colaboradores para que recuperem dos desgostos de amor. I know, eu também fiquei com inveja. Não sei se será uma medida de último recurso para evitar que os queridos japoneses recorram ao Hara-kiri para se livrarem da vergonha de um desgosto, mas porra, é uma ideia de se lhe tirar o chapéu. Assim já eles se podem munir de Canon's, protector solar e chapéus enormes e correr a Europa a registar tudo o que vêm, geralmente em poses duvidosas. Esquecendo assim que, se estivessem a trabalhar, muito provavelmente estariam a tentar encontrar uma maneira honrosa de se suicidarem.
Tudo isto levou-me a uma outra observação de cariz antropológico. Desta feita, tenho reparado no intensificar dos ressabiamentos pós-fim-de-relação, propiciados pelas novas tecnologias. No tempo dos afonsinhos, quando a internet e os telemóveis não eram um dado adquirido, tudo era mais simples. A relação terminava, podia haver uma ou outra troca de galhardetes, na pior das hipóteses, um crime passional se o ressabiamento fosse muito. Ora, já hoje em dia, não é raro encontrar uma frase, uma directa ou indirecta, em Messengers, Blog, Foto Logs, Picasas, Facebooks, Hi5's e afins, dirigida ao ex-ditocujo. Tenho-o visto com frequência, mas felizmente não o experiencio. É intrigante observar o ritmo alucinante a que as relações interpessoais têm evoluido e as consequências que daí advém.
Se esperam que retire daqui uma brilhante conclusão, estão enganados. Este foi um estudo informal da minha parte e, como tal, resultou apenas num constatar de factos e não numa premissa que pudesse salvar a humanidade destes "pequenos inconvenientes".
Tenho dito.

13/03/2008

Momento esquizofrénico do dia #2

14h20. Acabei de fumar um cigarro. Elevador do meu local de trabalho. A subir 7 andares sozinha e o espaço cheio de espelhos. Não resisto à tentação nem à pressão que é andar com Sex has made me stupid em repeat mental há mais de uma semana. Fiz uma dança super sexy, só para mim, dentro do elevador, em frente aos espelhos.
Shhttt....

Momento esquizofrénico do dia #1

10h50. Kilómetro 2 da A5 sentido Lisboa-Cascais. Ele vai na faixa da esquerda, eu na do meio. Eu no meu Opel Astra de '97, ele num carro tuning. Para além de já ser mau ele ser tuning, o carro pertence a uma empresa que "kita" carros e os ajuda a ficar com aquele aspectozinho suburbano. Estou atrasada para o trabalho, pico-me com ele e, surpresa das surpresas, ganho-lhe.
Soube-me tão bem! EU RULO, TU SUCKAS!

11/03/2008


Esta intrépida alminha de antropóloga que vive dentro de mim insiste em não fechar o olho vivo e mordaz à observação dos outros. E ultimamente têm sido objecto destes meus estudos, os casais de meia idade da classe média-baixa lisboeta. Sim, convem aqui diferenciar a amostra em estudo, porque ser um casal de meia idade na cidade ou sê-lo no campo, é algo de completamente diferente. E como a maior parte do tempo estou na cidade, é então a amostragem urbana a escolhida.
Ao pensar no vocabulário que predomina quando se chega a esta idade e nesta condição social, ocorrem-me algumas ideias pouco confortáveis: disfunção eréctil, excursões domingueiras com direito a demonstração de produtos inúteis e menopausa. A demonstrá-lo está um estudo feito por um camarada antropólogo chinês, que constatou que cerca de 1/3 dos casais chineses desiste do sexo na meia idade (faz-me alguma confusão o modo como esta amostragem foi obtida, visto os chineses serem o povo recatado e pouco dado a exposições da sua vida íntima que nós conhecemos). Ou seja: meia idade é igual a disfunção eréctil, que por sua vez equivale a ausência de sexo! Mas o povo chinês também em pouco pode ser comparado com o português, muito menos com um target tão específico como o aqui abordado. Enfim, pulgas atrás da orelha à parte, voltemos ao meu estudo.

Que carro usa esta amostragem de pessoas? Um Citroên AX, de preferência vermelho, a diesel, de 1985. Ou então a vertente BX, suspensões super sexy's, guardadinho na garagem, polido até à última réstia de pó da estrada, e que só vê a luz do dia ao fim de semana, para ir a Belém ver das modas. Isto se houver dinheiro para a gasolina, que isto hoje está pela hora da morte!


O que é que estas pessoas fazem ao fim-de-semana? Tal como já tinha indicado antes, um dos passatempos favoritos é enfiarem-se durante horas num autocarro que sai do Rego às 7h da manhã, com destino a Castro d'Aire ou a Penedo da Cova. Uma vez lá chegados, há almocinho, bailarico e forrobodó. Pelo meio, vem a senhora organizadora do repasto tentar impingir uma almofadinha peluda que massaja quando pressionada, um saquinho de viagem de fabrico duvidoso, ou um espremedor de laranjas made in china.


Outra actividade bastante apreciada é a gestão logísitica dos almocinhos de Domingo. Este fim-de-semana, será na casa do primogénito, também ele deprimentemente da classe média-baixa, funcionário público de barriga gorda, moldada à secretária onde se senta. No próximo, almoça-se na casa da filha, casada com um latifundiário ribatejano, e muito bem posta na vida, Graças a Deus, nossa rica filha, o orgulho lá de casa. Acreditem, não é fácil gerir esta questão dos almoços sem ferir os sentimentos dos rebentos.

Após o repasto, fica sempre bem uma ida com amigos ao café lá do bairro ou, se as finanças permitirem abastecer o veículo, quem sabe uma ida ao Terreiro do Paço. A ver as vistas! Convidam-se os vizinhos do rés-do-chão esquerdo, outro casal do género, sem nenhuma nuance que os distinga uns dos outros. E lá vão eles os quatro, os cus gordos das esposas apertados um contra o outro no banco de trás do AX ou do BX. Elas discutem naprons, receitas, cintas adelgaçantes para a barriga quadrada e os pelos faciais que não param de crescer. Eles discutem a condução péssima dos taxistas, o golo do Benfica, o estado da economia, a incompetência do Sócrates. E agora, aquilo que mais me faz confusão no meio disto tudo, e que o meu estudo não conseguiu explicar: enquanto este passeiozinho domingueiro medíocre tem lugar, o carro circula a 50 km/hora. E isto, meus amigos, é um fenómeno transversal ao campo e à cidade, que afecta todo o país. E que me afecta a mim, quando quero chegar rápido à praia e A PORCARIA DOS CONDUTORES DE FIM-DE-SEMANA NÃO ME DEIXAM!!!!!!


E agora, se me dão licença, vou só ali cortar os pulsos.
Viena acordara ainda mais cinzenta nesse dia do que em todo o decorrer do Inverno. Como que pressagiando esse primeiro, difícil, tímido rendez-vous. Algumas vinte japonesas konichiwa para ti também acumulavam-se na porta do Café Central, o mais emblemático da cidade. Pés apontados para dentro, costas curvadas, munidas de Canon's e Sony's e HP's, para não deixar escapar nenhum segundo de cidade.

E ela nem sequer tinha nenhum ódio de estimação contra os japoneses. Mas agora, que fixava insistentemente o olhar na porta, e não via senão rostos orientais... começava a sentir uma raiva miudinha por aquele povo. Apenas porque estava ansiosa por vê-lo chegar, não porque a xenofobia fosse defeito seu. Vamos sucumbir ao cliché e levar camisolas vermelhas. Já não se lembrava de quem partira semelhante frase, de tão ridícula que agora lhe soava. Mas lá compareceu, camisola vermelha em riste, pronta a enfrentar esse desconhecido misterioso. Já não se lembrava também porque começara a falar com ele, nem de como ele fora parar ao seu messenger. Mas a verdade é que se vinham falando fazia dias, meses ou anos. Já não se lembrava.

As japonesas não desarmavam. Entretanto chegavam também alguns americanos, com ar de nova-iorquinos. Porra, saiam daí! E nem sinal da camisola vermelha dele. Nem as mil calorias da Sacher Torta que devorava a faziam desviar o olhar da porta. E até o Peter Altenberg, indiferente à sua ansiedade, a começava a irritar. Ali tão quieto, tão frio, tão reluzente. Grrrrr! Só queria que ele chegasse depressa, que pusesse um fim àquele sufoco, queria ver a camisola vermelha que era o ponto final de dias, meses, anos de espera. Já não se lembrava.
Derrotada pela espera, baixou os olhos por alguns segundos. Ignorou as japonesas curvadas e os americanos trendy. E acabou por perder também a saída furtiva de um homem na casa dos trinta. De camisola vermelha.

10/03/2008

Uma penumbra silenciosa pairava sobre o areal imóvel, irreal, suspenso. Nem o mar para lhe vir beijar os pés. Sentou-se nua no beiral da casa branca que se estendia sobre a praia, essa praia que agora estava deserta, que a acolhia nua como agora se apresentava. Charro na mão direita, Chianti na mão esquerda, o pouco que ainda sobrava da última passagem pela Holanda e Itália. Fechou os olhos com força, desejando que quando os abrisse, a chuva lhe lavasse a pele imunda. Mas nem a mais leve brisa soprou, nem vivalma cruzou o areal vazio, nem o mar subiu centímetro algum. Sentiu a pele arrepiar-se com o ar ainda frio de Abril, enquanto recordava o pincel que lhe cruzara a pele na noite anterior. Numa tinta de cor que não sabia definir, uma cor que a deixava ansiosa pelo tinto do vinho, pela dormência da ganza. Deitou-se na madeira húmida do alpendre e deixou-se ficar, presa pelos elementos. Mais um pouco de vinho, mais um pouco de ganza. E depois a dormência dos sentidos.
No pouca sobriedade que lhe restava, ecoavam as palavras sussuradas no breu da noite.
A uma luz perigosa como água
De sonho e assalto
Subindo ao teu corpo real
Recordo-te
E és a mesma
Ternura quase impossível
De suportar
Por isso fecho os olhos
(O amor faz-me recuperar incessantemente o poder da
provocação. É assim que te faço arder triunfalmente
onde e quando quero. Basta-me fechar os olhos)
Por isso fecho os olhos
E convido a noite para a minha cama
Convido-a a tornar-se tocante
Familiar concreta
Como um corpo decifrado de mulher
E sob a forma desejada
A noite deita-se comigo
E é a tua ausência
Nua nos meus braços
(...)
Só mais um gole, só mais um bafo...

09/03/2008

Nem sempre o corpo se parece



Nem sempre o corpo se parece com
um bosque, nem sempre o sol
atravessa o vidro,
ou um melro cante na neve.
Há um modo de olhar vindo
do deserto,
mirrado sopro de folhas,
de lábios, digo.

Eugénio de Andrade
ELE

tens os olhos mais bonitos que já conheci tens os olhos mais bonitos que já conheci tens os olhos mais bonitos que já conheci. Sempre em repeat mental, enquanto esperava que a figura dela surgisse por entre as canas amontoadas à beira rio. Sempre em repeat, para não esquecer nenhuma das palavras que lhe queria dizer nessa tarde tens os olhos mais bonitos que já conheci tens os olhos mais bonitos que já conheci.

Em rota de colisão desde que algum desígnio caprichoso do destino os fizera cruzar numa malha temporal irreal. Colisão colisão tens os olhos mais bonitos que já conheci. Tentava fixar o movimento ondulante do rio, esquecer a cor cinzenta da tarde e deixar-se levar. Por uma qualquer gaivota errante, nómada, animal. Esperava e sempre tens os olhos mais bonitos que já conheci. E ela sem saber. Porque ele nunca lho tinha dito. Como num bilhete de suicídio, que se quer conciso, preciso, directo. Como num telegrama, à antiga tens.STOP. os.STOP. olhos.STOP. mais.STOP. bonitos.STOP. que.STOP. já.STOP. conheci.STOP.

Suspenso pelo ar frio da tarde finita, às 7h no rio. Sim, às 7h. Eu vou lá estar à tua espera.

E esperou

E esperou

E esperou

E esperou

E esperou...

ELA

Folhas infinitas, dos poemas dele, das partituras, dos esquiços, dos bilhetes, dos apontamentos, dos pensamentos que só ela lhe conhecia. Às 7h no rio. Sim, lá estarei à tua espera. Em rota de colisão, movimento centrípeto infinito desde que algum desígnio caprichoso do destino os fizera cruzar numa malha temporal irreal. (já lemos isto algures). Queimou, pegou fogo, incendiou aquela pilha de papel que resumia a vida dele. Sim, ontem teria sido às 7h no rio. Sim, lá estarei à tua espera. Mas não hoje, nunca hoje. Porque hoje é o dia em que soube o teu segredo. Porque hoje é o dia em te deixo o meu bilhete de suicído. Porque hoje é o dia em que sucumbi às mãos do teu pecado. Não quero mais esta vida onde não sobra réstia de ti. Ardem os resumos da tua vida, os teus cadernos onde nunca cabi numa linha. Aqueles que escreveste ontem, antes, numa outra vida onde não havia lugar para mim. Ardem e também eu por dentro ardo com eles. Porque tu és esses cadernos, esse poemas, essas partituras esquiços bilhetes apontamentos. Morro e não me sinto ser. Parto e nunca mais será às 7h no rio.

Nunca

Nunca

Nunca

Nunca

Nunca...

07/03/2008

Been there, done that

Em O Choque de Civilizações, um dos meus ensaios favoritos de Relações Internacionais, Samuel Huntington profetiza sobre o futuro da ordem mundial. E diz o senhor que a principal fonte de conflito dos nossos tempos se dá na esfera cultural. O que não será novidade para ninguém, olhando ao inflamado debate a que deu azo o dito livro.

Não almejando aqui a dar-vos nenhuma lição sobre RI (quem sou eu...), cabe então informar que também eu tive direito ao meu "choque de cultura" particular. Numa sauna em Payerbach, uma (não sei se terá sequer direito a esse nome) aldeia perdida nos alpes austríacos. Cheias do nosso pudor sul europeu, lá fomos inocentemente para a sauna, armadas de bikinis e toalhas. E não tardou muito até percebermos o desconforto que os nossos - já de si reduzidos - bikinis provocavam nos senhores de meia idade nórdicos que estavam connosco no cubículo. Nunca me senti tão despida como quando senti o olhar reprovador dos senhores, que nos olhavam nus, sexos descaídos, peles por todo o lado. Como se nos quisessem diminuir na nossa diminuta e retrógrada condição de sul europeias.


Até para mim, europeia liberal de coração, é incrível como no Espaço Europa ainda prevalecem estes vácuos culturais.
Hoje acordei a pensar naquela notícia do segurança que apareceu esfaqueado no Colombo. Logo eu, que sou pouco optimista e ainda menos entusiasta das autoridades que nos "governam" aqui no rectângulo. E a tal notícia veio reforçar ainda mais esta minha descrença. Porque vivemos num país onde a PSP afirma peremptoriamente que não está posta de parte a hipótese de se tratar de um suicídio.

Calma. Reler a notícia. Respirar fundo. 3...2...1...


Se a história não fosse dramaticamente triste, seria altura para soltar uma valente gargalhada. Sim, porque as nossas autoridades naõ hesitam em defender que, quando uma pessoa pretende atentar contra a própria vida, vá de espetar uma facada no peito. Mas como à primeira não se morre logo e não se fica a esguichar sangue e a dor não é suficientemente lancinante, vá de mandar a segunda e, espanto dos espantos!, a terceira facada. Sim, porque a dor de uma facada no peito é um mal menor, o importante é cumprir o propósito inicial: o suícidio.

Tenho dito.

06/03/2008

Há alturas na vida em que uma mulher como eu é forçada a tomar decisões. Hoje está a ser uma dessas alturas. Tenho aqui umas fotos novas muito giras que quero descarregar... Mas eis que se abate sobre mim a dúvida. O dilema. O pânico!




VERSUS








Ah pois é. A internet é uma maravilha, as redes sociais modernas são o máximo, bla bla bla. Poderia continuar a enumerar louvores infinitos à internet. Mas quando chega a altura de decidir onde descarregar as milhentas fotos que para aqui tenho... Não me consigo decidir.


É tão difícil ser uma mulher da internet nos dias que correm.

Novamente cinco de março... de dois mil e oito.

Ok, eu vou deixar de tentar compreender o que quer que seja que se passa à minha volta. Basta olhar para o post anterior para saber o que o dia de ontem significou para mim. E, coincidência das coincidências, ironia das ironias, foi também ontem que nasceu o meu novo irmão, João Pedro (filho do meu pai, para não far azo a confusões nas vossas cabecinhas). É mesmo um sinal da vida a mexer, como diz um amigo. E é bem verdade. E bem estranho, uma nova vida, no dia de aniversário de uma morte. Caprichos que não entendo.
Quem sou eu para tentar compreender isto...



Tudo quanto vive provém daquilo que morreu. (Platão, Fédon)

05/03/2008

ISABEL





Nunca tinha dito o nome dela. Mas era Isabel. E há precisamente 365 dias atrás, eu ainda a tinha, e ainda achava que íamos ter uma hipótese de ser felizes os 3, como sempre sonhámos. Mas horas depois tudo mudou. O mundo como eu o conhecia até então desabou. E nada aconteceu como no poema da Sophia. O vento não passou, o chão não estalou, as portas não bateram. Foi imediato e sem pré-aviso. E tudo dentro de mim ficou ainda mais cinzento, mais desmaiado, mais fraco.


Quando era miúda, adormecia inúmeras vezes lavada em lágrimas porque tinha medo de me perder dela. Ou porque tinha um pavor enorme que ela morresse e me deixasse sozinha. Chorava baixinho, soluçava e, quando não aguentava mais, pedia-lhe para ficar enroscada nela. Hoje sinto como se isso tivesse sido uma espécie de aviso "aproveita enquanto a tens, mima-a, dá-lhe o teu melhor, olha que não a vais ter sempre". E foi isso que fiz toda a vida, perante os olhares enciumados das minhas amigas, que invejavam a relação que nós tínhamos. Ela era mesmo a mãe mais querida do mundo. Com quem apanhei a minha primeira bebedeira. A quem contei todos os segredos que fazem parte do imaginário de adolescente. Que ia comigo dançar no carnaval. Que me deixou ter um namorado aos 13 anos. E aos 15. E aos 16. Que nunca me julgou nem desconfiou de mim, nem me tentou cortar asas. Deixou-me voar, deixou-me viajar, deixou-me ser eu, e fez de mim aquilo que sou hoje. Ajudou-me a criar esta armadura que me protege dos embates duros, como que se me estivesse a preparar para o que aconteceu há um ano atrás.



Esta é a praia onde a levei no último dia que passou fora do hospital. Pediu-me que fosse com ela à praia, queria sair de casa, espairecer, ver o mar... e que estivessemos juntas. Fui, e relembro cada detalhe dessa tarde vezes sem conta. Lembro- me das cores com que o sol se pôs nesse dia. Lembro-me do prazer com que comeu o gelado comprado na Dona Natércia. E de como ficámos as duas em silêncio, a ver o mar, como se procurassemos a paz que o inferno dos meses seguintes nos iria roubar.

Um ano volvido, encontro-a sempre, de cada vez que volto à praia em dias de inverno. Naqueles dias em só as gaivotas e o vento povoam o areal e o mar, nos dias em que é obrigatório um casaco, um gorro, e uma erva amiga que distorça a realidade.

E passo em revista cada regresso a casa, em que os abraços que me dava me sabiam ao mundo inteiro. Ou quando me levava ao aeroporto, chorosa. Como daquela vez em que furou toda a segurança do Aeroporto da Portela só para me dar mais um beijo, porque ia atravessar o Atlântico com 11 anos e ela teve medo de não me voltar a ver. E a cara que fez, quando após uma ausência de 5 meses em Roma, cheguei a casa de surpresa, e ela me esborrachou entre beijos e abraços e muitas saudades acumuladas. E as mensagens que me mandava, tão abreviadas em 'k's e 'x's, a ponto de eu não entender nada. E aquela vez em que jogou comigo uma espécie de Big Brother, e deixou espalhadas, em pontos estratégicos, mensagens com tarefas que, a serem cumpridas, davam direito a uma recompensa.

Tantas, tantas e tantas coisa que cabiam aqui, e que a minha memória me devolve todos os dias em lágrimas nos olhos. Momentos infinitos, incontáveis, horas de ternura que ela me deu sem pedir nada em troca, com aquele olhar infindavelmente doce que tinha. E um coração enorme.

Era a minha mãe. E eu já não a tenho. Sinto-me sozinha.

#Imagem: by molin_one, Praia da Areia Branca

04/03/2008

Mãe (1 Junho 1965 - 5 Março 2007)


A hora da partida



A hora da partida soa quando

Escurecem o jardim e o vento passa,

Estala o chão e as portas batem, quando

A noite cada nó em si deslaça.

A hora da partida soa quando

As árvores parecem inspiradas

Como se tudo nelas germinasse.

Soa quando no fundo dos espelhos

Me é estranha e longínqua a minha face

E de mim se desprende a minha vida.




Sophia de Mello Breyner

Um pouco à moda da curse of millhaven, é caso para dizer que, se o Mestre tivesse existido, eu tinha casado com ele...



(suspiro)










Passei toda a noite, sem dormir, vendo, sem espaço,
a figura
[dela,
E vendo-a sempre de maneiras diferentes do que a
encontro
[a ela.
Faço pensamentos com a recordação do que ela é
quando
[me fala,
E em cada pensamento ela varia de acordo com a sua
[semelhança.
Amar é pensar.
E eu quase que me esqueço de sentir só de pensar
nela.
Não sei bem o que quero, mesmo dela, e eu não penso
[senão nela.
Tenho uma grande distracção animada.
Quando desejo encontrá-la
Quase que prefiro não a encontrar,
Para não ter que a deixar depois.
Não sei bem o que quero, nem quero saber o que
quero.
[Quero só
Pensar nela.
Não peço nada a ninguém, nem a ela, senão pensar.

Alberto Caeiro (1889-1915) (!)

03/03/2008

quanto mais te leio
menos me entendo
mais me perco

cinco de março de dois mil e sete

foi assim que ficámos no dia depois de amanhã


Como quem espera o autocarro numa cidade que desconhece.


Como quem desafia o sono que não chega em quarto alheio.


Como quem segue no elevador com o vizinho de quem não se gosta.


Como um ateu que entra no templo que não reconhece.


Assim adormeci ontem, assim acordei hoje. Com uma sensação de desconforto, de algo/alguém que falta. Queria voltar a estar dentro daquela tenda de circo, onde inebriada pela erva amiga, deixava a luz entrar-me desgovernada olhos adentro. Onde deixei a minha identidade, pintada de fresco nos grafittis velhos das paredes. A música distraiu-me, retraiu-me, fez-me rodopiar dentro da tenda e voltar ao mesmo sítio sem de lá ter saído. O discernimento que chegou no dia a seguir trouxe a realidade da qual quero fugir. E não encontro em mim a tecla, ti ti ti, onde carrego e passo para outra realidade. Bem mais amena, mais acolhedora.


É o desconforto dos dias que passam adulterados à minha frente. Do Inverno que termina para abraçar a Primavera.


Quero e não consigo.


#Imagem: Shhh,
Rui Lebreiro